Incentivar as empresas no desenvolvimento da sustentabilidade nas operações tem sido um dos principais objetivos do Pacto Global da ONU, criado há 20 anos pelo diplomata ganês Kofi Annan (1938-2018).

A rede está presente em 160 países e possui mais de 16 mil empresas signatárias. No Brasil, foi fundada em 2003 e atualmente é a terceira maior do mundo, com mais de 1,1 mil signatários.

A grandeza do Pacto também vem acompanhada de desafios. Segundo Carlo Pereira, diretor-executivo da Rede Brasil do Pacto Global, os principais são o alcance dos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) e o respeito aos Dez Princípios, que abrangem as frentes Direitos Humanos, Trabalho, Meio Ambiente e Anticorrupção.

Carlo Pereira, diretor-executivo da Rede Brasil do Pacto Global. Crédito: Divulgação

“Temos visto este aumento crescente do interesse das empresas pela sustentabilidade. Agora, precisamos ver mais ação para que mudanças profundas e importantes ocorram na sociedade, urgentemente. Em alguns temas estamos perdendo o timing, como a mudança do clima”, alerta o diretor-executivo.

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O Pacto não é um selo ou um certificado de boas práticas das empresas signatárias. Na verdade, ele é um compromisso voluntário feito pela principal liderança da companhia para seguir os Dez Princípios. Em 2015, a rede também incluiu a responsabilidade de as organizações signatárias contribuírem para o alcance dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Os ODS estão alinhados com a Agenda 2030, e isso quer dizer que restam 10 anos para o cumprimento dos objetivos. Parece muito tempo, mas é pouco frente à realidade brasileira. 

“Precisamos reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Isso é urgente. Precisamos reduzir as desigualdades sociais, ampliadas pelo racismo, pelo preconceito. Diversidade é outro tema essencial. Se tudo continuar como está, apenas o ODS 7 será alcançado no Brasil. E não queremos e não podemos deixar que as coisas sigam nesta direção”, alerta Carlo. 

Sair da esfera teórica e trazer os objetivos para a prática é outra tarefa desafiadora. Por isso, neste ano, o programa lançou o Ambição pelos ODS. A ideia é buscar o engajamento das empresas em diversas metas relacionadas aos ODS por meio de treinamento, assessoria individual, atividades práticas e conexões globais e locais.

A estrutura do Ambição pelos ODS será definida no próximo semestre de 2021. Apesar de possuir 1 mil signatários, apenas 24 empresas irão participar deste projeto, número pouco expressivo perto do universo de companhias participantes do Pacto. 

Segundo Carlo Pereira, "Até o momento, mais de 22 empresas assumiram o compromisso. Pouco ainda, considerando o tamanho da rede, mas iremos trabalhar para ampliar esse número". Crédito: Equipe de Arte Aupa.

Outra ação para apoiar o cumprimento das metas é incentivar o engajamento das empresas para além do departamento de sustentabilidade. 

“Para interagir diretamente com a alta liderança das empresas, especialmente com os CEOs, criamos o Liderança com ImPacto, formado hoje por 12 CEOs, que atuam como porta-vozes dos ODS, mobilizando funcionários, cadeia de valor e setor empresarial, e como implementadores da Agenda 2030 dentro de suas próprias empresas”, explica Carlo, diretor-executivo da Rede Brasil. 

O Liderança com ImPacto também reflete as desigualdades que o país carrega. Dos 12 CEOs participantes, apenas três são mulheres e não há representação da população negra entre eles.

CEOs do Liderança com Impacto no Prêmio ODS 2019. Crédito: Divulgação.

O combate ao racismo e ao machismo estão na pauta do Pacto. Já que o programa reconhece que não há como cumprir os ODS com essas desigualdades tão latentes na sociedade. 

Em 2020, o programa Equidade é Prioridade foi lançado com a premissa de obter compromissos públicos das empresas para que tenham, até 2025, 30% de mulheres em posições de alta liderança, e/ou 50% até 2030. 

“Até o momento, mais de 22 empresas assumiram o compromisso. Pouco ainda, considerando o tamanho da rede, mas iremos trabalhar para ampliar esse número”, pontua Carlo. 

Para 2021, o objetivo é lançar uma outra frente do programa com uma meta de posições de liderança ocupadas por negros, que, apesar de ser a maioria da população brasileira, está apenas em 4,7% dos cargos executivos das empresas – segundo dados de 2016 do Instituto Ethos.

Contrastes
Contar com um universo grande de empresas integrantes também tem seus desafios. Entre seus membros, o Pacto Global tem a participação do Carrefour. A rede de hipermercados está envolvida em casos de violação de Direitos Humanos, como a recente morte de João Alberto, que foi espancado por dois seguranças da loja de Porto Alegre (RS). A violência se configura como racismo estrutural, que está inserido na sociedade e se reflete dentro das empresas. 

Por se enquadrar como um compromisso voluntário, a supervisão das empresas e  emissão de certificados de integridade não são de responsabilidade do Pacto, afirma o porta-voz.

O que fazemos é pedir que anualmente ou a cada dois anos, no caso das organizações, digam o que vêm fazendo em relação aos 10 Princípios e aos ODS. Além disso, nossa equipe acompanha o que vem sendo publicado pela mídia e situações que indicam violação dos 10 Princípios são tratadas localmente e globalmente”, comenta Carlo. 

Em relação ao caso do Carrefour, o Pacto se posicionou globalmente, em comunicado da diretora-executiva, Sanda Ojiambo.

“Como o Carrefour é signatário do Pacto Global da ONU, entramos em contato com a empresa, solicitando mais informações. Esperamos que todas as organizações participantes defendam nossos 10 Princípios e implementem os Princípios Orientadores para Empresas e Direitos Humanos. Estamos monitorando de perto a situação e aguardaremos o resultado da investigação oficial”, afirma a executiva no comunicado publicado no dia 25 de novembro de 2020.

Sanda Ojiambo, diretora-executiva do Pacto Nacional das Nações Unidas. Créditos: Divulgação.

A reportagem também entrou em contato com a assessoria do Carrefour. Em nota, a empresa afirma que estabeleceu um plano de curto, médio e longo prazo para aprimorar práticas antirracistas e promover a inclusão social de negros e negras. 

A companhia também prevê a revisão da política de  Valorização da Diversidade, até o final de janeiro de 2021, para que “Ela enfatize o tratamento rigoroso dos casos de discriminação e racismo por parte de seus colaboradores, clientes e fornecedores, com a produção de um hotsite para que todas as ações sejam acompanhadas de forma transparente pela sociedade”.

No comunicado, o Carrefour descreve que pretende contratar, anualmente, cerca de  20 mil colaboradores(as) negros, em parceria com associações e profissionais de RH, além de criar um Programa de Inclusão de empreendedores em sua cadeia de valor, com apoio de entidades e organizações intermediárias focadas na população negra.

Outra ação divulgada pela empresa é a internalização de 100% da equipe de segurança que atua dentro das lojas, com o objetivo de implementar a mudança até o fim de outubro de 2021. 

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