A população brasileira está cada vez mais conectada. Em 2019, 74% da população tinha acesso à internet, segundo a pesquisa TIC Domicílios. Com mais conexão, há também vagas na área tecnológica, mas muitas delas não são preenchidas devido à falta de profissionais qualificados.
Segundo a Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais, a Brasscom, o Brasil forma 46 mil pessoas com perfil tecnológico por ano, porém, estima-se que, de 2019 até 2024, a demanda por profissionais será de 420 mil. Se não houver mudanças, existirá um déficit de 260 mil profissionais.
Em um esforço para ajudar a fechar o vazio que as diferenças educacionais causam, muitos programas foram criados para ensinar aos jovens as habilidades básicas de ciência da computação, ajudando-os a conseguir empregos em áreas que precisam de trabalhadores com qualificações voltadas à tecnologia.
Um exemplo é o trabalho da Meu Futuro Digital, organização que pretende integrar jovens, instituições de ensino, empresas contratantes, startups, governo, organizações não-governamentais (ONGs), entre outras entidades. Rubem Duek, cofundador e CEO do Meu Futuro Digital explica que “Houve um aumento da demanda por novos profissionais. Por isso é necessário investir muito em tecnologia e na mão de obra”, relata.
A organização surgiu por meio de um grupo de CEOs, CIOs, CFOs, empresários, empreendedores, educadores e governantes interessados em fomentar a tecnologia da informação (TI) no Brasil, ampliar a capacitação e a empregabilidade de jovens e adultos no setor e criar soluções para crescimento de mão de obra qualificada.
De acordo com Rubem, a dura realidade da pobreza no Brasil é capaz de esconder e sufocar talentos. Um exemplo deste contexto é Rodrigo Nascimento, de 19 anos e morador do município de Capela do Alto, interior de São Paulo. Ele é o hexacampeão da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) – e mesmo tendo grande potencial, Rodrigo tinha que conciliar o trabalho com os estudos, chegando a trabalhar 12 horas por dia em um supermercado. Ele fez a capacitação do Meu Futuro Digital, hoje estuda Engenharia da Computação e trabalha em uma empresa de tecnologia. “Quantos milhares de Rodrigo Nascimento estão trabalhando em subempregos? Infelizmente, no Brasil a pobreza oprime e esconde talentos”, ressalta o CEO do Meu Futuro Digital.
Entre algumas das metas da organização está duplicar a mão de obra qualificada em TI de 1,5 para 3 milhões em 8 anos e usar a tecnologia como alavanca para acelerar a inclusão social e digital no Brasil. E isso deve ser feito através da conexão de projetos, ampliação e atuação em outros Estados.
Outra iniciativa que busca qualificar jovens na área tecnológica é a escola de desenvolvedores de software Trybe. A proposta da escola é oferecer um currículo com base no que o mercado de trabalho busca em profissionais de tecnologia. Atualmente, a escola-startup possui 700 estudantes matriculados e atraiu fundos das gestoras Verde – de Luis Stuhlberger – e Milênio, além dos multi-family office Brainvest e Lakewood, que investiram 50 milhões na startup. Como forma de ampliar o acesso, o aluno começa a pagar o investimento no curso somente depois que conseguir um emprego na área.
Anderson Adriano Godoy foi aluno da Trybe. Iniciou os estudos em abril de 2020 e de forma remota: “Com menos de três meses de curso, junto com um amigo, criamos um site totalmente do zero, coletando informações em tempo real dos dados sobre COVID-19. O site está no ar desde então”, explica.
Anderson, que hoje trabalha em uma empresa multinacional de consultoria de gestão e tecnologia da informação, afirma que já tinha realizado cursos nesta área, mas não sabia programar. “Hoje me considero uma pessoa com todas as habilidades necessárias para o desenvolvimento de software”, afirma ele.
A atuação da Meu Futuro Digital e da Trybe contribui para que jovens se interessem pela área da tecnologia. Porém, mesmo com vagas sobrando, empresas disputam profissionais experientes para acelerar a transformação digital e muitos iniciantes não conseguem emprego, o que contradiz a oferta de vagas.
Para Charles Neu, professor de Ciência da Computação da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), a demanda por profissionais da área da computação será cada vez maior. Segundo ele, há vagas voltadas aos profissionais bem capacitados, já que, para algumas posições, existe uma sequência de conhecimento, assim como em outras áreas – contudo, é necessário trabalhar para desmistificar o setor de tecnologia.
“Um dos projetos que estamos realizando é voltado aos alunos do Ensino Médio da cidade de Santa Cruz do Sul (RS). O objetivo é mostrar que a Ciência da Computação é um caminho interessante e promissor. Quando pensamos nas maiores empresas do mundo estamos falando de Apple, Amazon, Facebook, Microsoft, ou seja, empresas da área da tecnologia”, pontua.
O docente ainda enfatiza que há caminho a ser trilhado em conjunto com os pais e que a escolha profissional também deve ser feita avaliando a perspectiva de atuação profissional no futuro: “Quando vemos pesquisas mostrando as 20 profissões mais promissoras do mundo, várias delas são de tecnologia. Também precisamos olhar para isso. Do contrário, vemos muitos profissionais formados em outras áreas que não conseguem empregos e que acabam trabalhando em subempregos”, explica.