Estados da Amazônia Legal não estão preparados para eventos climáticos extremos

Relatório apresenta dados sobre como este território trata as Políticas Públicas para mudanças climáticas

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Como os Estados da Amazônia Legal tratam as Políticas Públicas para mudanças climáticas? Divulgado em outubro, o relatório “Emergência climática: estratégias subnacionais na Amazônia” aponta que  nenhum dos estados da Amazônia Legal (Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins) possui sistemas de alerta e planos de contingência permanentes para eventos extremos, como inundações, secas, incêndios florestais e ondas de calor. O estudo é de autoria do Achados e Perdidos, iniciativa da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e da Transparência Brasil, realizada em parceria com a Fiquem Sabendo e com financiamento da Fundação Ford.

No relatório, foram mapeadas as Políticas Públicas dos nove estados da Amazônia Legal que existem em relação às mudanças climáticas. Segundo a avaliação de Jéssica Botelho, repórter do Achados e Pedidos e responsável pela pesquisa, “Apesar de haver uma preocupação de todos os Estados, falta uma política nacional, como também coordenação e gestão entre Estado e Município”, declara.

Luis Felipe Adaime, CEO e fundador da Moss, climatech que conecta empresas com soluções ambientais inovadoras por meio da tecnologia blockchain, acredita que as políticas e estratégias voltadas às emergências climáticas não estão alinhadas. “O Brasil, que tem diretrizes nacionais para a redução dos impactos das mudanças climáticas, precisa que o Governo Federal promova mais sinergia entre todas as esferas em relação a gestão dessas políticas”, defende.

A Amazônia Legal é o território com maior biodiversidade do planeta em plantas, animais e microrganismos, com uma área que corresponde a 59% do território brasileiro, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Ainda: é neste território que residem 56% da população indígena brasileira.

E diante da frequência de uma extensão que sofre cada vez mais com os efeitos da emergência climática, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, é crucial entender a importância de compromissos climáticos e ambientais que podem ser assumidos pelos governos locais da Amazônia Legal brasileira.


Ações dos Estados da Amazônia Legal

Claramente, cada Estado tem suas demandas, além de formas de conduzir políticas e estratégias voltadas às mudanças climáticas.  Para a professora e pesquisadora Sonaira Souza da Silva que estuda a aplicação geo no contexto amazônico, de modo geral: “As políticas ambientais no Brasil têm sido pouco implementadas. São muitos planos e informações, mas pouca ação, de fato. Uma demonstração são as altas taxas anuais de desmatamento, queimadas, garimpos ilegais, entre outros”, explica. Sobre as falhas na aplicação de leis ambientais no Brasil, o relatório “Estado de direito ambiental: primeiro relatório global”, da ONU, aponta a incapacidade de implementar e de fazer cumprir essas leis, principalmente no Brasil. O documento ainda mostra que entre 2000 e 2015, 527 ambientalistas foram mortos no Brasil.

Sonaira é responsável pelo projeto que monitora a qualidade do ar do Acre. A iniciativa sobre a rede de monitoramento da qualidade do ar é uma parceria entre a Universidade Federal do Acre e o Ministério Público do Estado do Acre. Mesmo com o projeto em andamento, ela defende que “No Acre, não há política ou plano específico sobre mudanças climáticas, mas planos temáticos sobre desmatamento, queimadas e recursos hídricos, mesmo tendo uma secretaria de Estado, o Instituto de Mudanças Climáticas e Regulação de Serviços Ambientais (IMC) em atuação”.

Por sua vez, a atuação no Tocantins é defendida por Marli Santos, diretora de Gestão e Instrumentos Ambientais da Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Semarh):  “Estamos trabalhando com mitigação (redução de emissões) e adaptação (estudo sobre os impactos das mudanças climáticas no Tocantins e medidas que precisam ser implementadas). Construímos nos últimos 16 anos todo um trabalho de elaboração e implementação de políticas públicas voltadas para as mudanças climáticas”, explica.

Essa atuação dos departamentos estaduais, com a presença de políticas ou planos de gestão de recursos hídricos para desenvolver Políticas Públicas de mitigação e adaptação, é reiterada no relatório Emergência climática: estratégias subnacionais na Amazônia:

“Há a existência de departamentos dentro da estrutura administrativa dos órgãos de gestão ambiental e de fóruns de mudanças climáticas e a presença de políticas ou planos de gestão de recursos hídricos em todos os estados também é um destaque positivo”, alerta o documento.


Dados do relatório

O trabalho analisou a presença de instrumentos de gestão ambiental em observação aos efeitos das mudanças climáticas nos estados que compõem a Amazônia Legal. Para verificar a atuação destes territórios, as informações obtidas foram cruzadas com dez indicadores desejáveis para o controle da situação de emergência climática na região, divididos em três grupos: governança, mitigação e adaptação.

A pesquisa revela que dos nove Estados, quatro (Acre, Amapá, Mato Grosso e Pará) não têm sistemas de monitoramento para acompanhar o impacto da emergência climática sobre os recursos naturais, a biodiversidade e o clima.

Ainda conforme o relatório, a maior parte dos Estados criou uma política relativa a mudanças climáticas, com aprovação de lei estadual. Inclusive, o Ministério Público Federal e os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul criticaram, em outubro de 2020, o Governo Federal por omissão em relação a queimadas em biomas brasileiros.

Vale lembrar que a Amazônia Legal brasileira registrou 8.381 km² de desmatamento no acumulado de 11 meses, entre agosto de 2020 e junho de 2021, a maior devastação para o período em dez anos, segundo o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).

Para Sonaira Souza da Silva, o relatório aponta para a ação dos governos. “Os efeitos das mudanças climáticas são devastadores, principalmente para as populações mais pobres que não têm condições para se adaptar a esses extremos”. O dado é confirmado pelo relatório  “Monitorando o Avanço na Saúde e nas Mudanças Climáticas”, publicado na revista cientifica Lancet Countdown, de 2017, e que enfatiza que os países mais pobres são os mais afetados por mudanças climáticas e poluição. Um dos dados revelados é que entre 2000 e 2016, houve um aumento de 46% na quantidade de desastres naturais no mundo.

Contudo, um avanço nacional, em abril de 2021, foi a aprovação da resolução do Plano Amazônia 2021/2022, que “Estabelece diretrizes para a continuidade das ações de fiscalização e combate aos ilícitos ambientais e fundiários, particularmente o desmatamento ilegal e as queimadas na Amazônia Legal”.

No relatório publicado pela Abraji, como avaliação final, é apontado que os Estados estão, sim, preocupados com as mudanças climáticas: “A presença de políticas ou planos de gestão de recursos hídricos em todos os estados é um destaque positivo, considerando o impacto desse aspecto ambiental sobre as condições de vida, não só da população local, mas de todo o país, como se pode observar diante da atual situação hídrica e energética brasileira”, segundo o documento. 

Tal como afirma Jéssica Botelho, “É necessário esse esforço conjunto, na estrutura administrativa de governos estaduais e municipais para agregar as estratégias”. Luis Felipe Adaime completa ainda que “É preciso haver trabalho conjunto entre desenvolvimento socioeconômico, conservação ambiental e redução de emissões relativas ao uso da terra”.

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