São Paulo é uma das cinco cidades mais populosas do mundo, com mais de 20 milhões de pessoas, sendo que só no município vivem 12 milhões de habitantes. Proporcionalmente são os seus problemas, desafios e contrastes. De acordo com o estudo realizado em conjunto pela prefeitura de São Paulo com a organização internacional Aliança de Cidades, em 2007, a capital paulista possuía 1.538 favelas, ocupando um território de 30 quilômetros quadrados. O Censo IBGE 2010 apontou que cerca de 2,1 milhões de pessoas na região metropolitana moram em favelas.

Sim, estamos diante de uma enorme desigualdade e, definitivamente, não dá para viver assim. Por isso, os próprios moradores das comunidades se mobilizam para transformar a realidade de seus territórios e muitas iniciativas e projetos começaram a surgir para dar voz e visibilidade ao que antes ficava somente nos extremos da cidade. Aqui contamos as histórias de quatro destas iniciativas. Hoje, especialmente, de Claudio Miranda, do Instituto Favela da Paz.

Das lembranças de menino

“Meu pai fala frases incríveis, como aquelas que mudam a nossa vida. Quando eu tinha nove anos ele disse que eu podia ser quem eu quisesse. Isso mudou a minha vida”, conta Claudio Miranda, fundador do Instituto Favela da Paz. Claudio de músico, multi-instrumentista, produtor musical, empreendedor social, educador e um ser-humano para lá de humano,  nasceu no Jardim Ângela, periferia da zona sul de São Paulo e foi lá que colocou toda a sua energia para promover uma cultura de paz.

Claudinho, como é conhecido, conserva as boas lembranças da infância, sempre acompanhada de perto pelos pais que o impulsionaram para realizar seus sonhos. “Meus pais são os maiores investidores sem dinheiro na minha vida”, brinca. Aos nove anos, ele foi pegador de bolinhas de tênis no clube Indiano, um dos clubes mais tradicionais e ricos na época, frequentado por figuras como Pelé, Rivelino, Casagrande. “Eu vivia outra realidade e isso me ajudou muito”, conta. Como seu pai disse uma vez “ele podia ser o que quisesse”. Esse mantra é o que move Claudinho e fez com que ele quisesse mudar a comunidade onde mora sem ter que se mudar de lá.

Isso não quer dizer que Claudio não tenha visto o mundo. Ele faz parte de uma rede internacional de eco vilas e cultura de paz e, com isso, já foi para vários países da Europa, Américas, inclusive para Palestina! “Hoje, eu viajo o mundo, mas sempre volto para o mesmo lugar”, conta.

Transformando o Jardim Ângela

Para quem não sabe, durante anos o Jardim Ângela foi considerado o bairro mais perigoso do mundo pela ONU. O título negativo foi dado em 1996 e só foi superado em 2013 após muita articulação. Claudinho tem sua contribuição nessa mudança que vem acontecendo por lá. “O que vem melhorando as favelas do mundo é a relação que as pessoas têm. Um precisa do outro e quando um precisa do outro as coisas começam a mudar”, descreve Claudinho.

Músico por vocação, Claudinho usa seus melhores instrumentos para promover a paz e a mudança – violão e voz. Em 1989, criou a banda Poesia Samba Soul. Ele chegou a ter 300 alunos sem nunca ter sido professor. A comunidade se inspirou nele, bandas começaram a se formar e, através das canções, deu-se início a um novo tipo de comunicação. “Quando se vive em um lugar muito violento a comunicação verbal não funciona. O que funciona é o olhar, o toque, o sentir, o fazer”, explica.

Em 2010, fundou o Instituto Favela da Paz, lá mesmo, no Jardim Ângela. O Instituto acolhe diversos projetos, na verdade, é uma rede de empreendedores sociais com um único objetivo – transformar a realidade dos moradores da periferia através de arte, cultura, inovação e parcerias. Além disso, a sustentabilidade é marca registrada no Favela da Paz. “O primeiro sistema de biogás de São Paulo está lá. Temos chuveiro solar, retenção de água da chuva, alface crescendo na parede, uma cozinha vegetariana, um estúdio de música e, tudo isso, é possível porque entendemos que quando sentimos, acontece”, comenta.

Periferia Sustentável

O projeto Periferia Sustentável, idealizado pelo irmão Fabio Miranda, busca solucionar problemas com a implantação de energias renováveis e uso consciente da água. “Transformamos as dificuldades em ideias e projetos funcionais”, explica Claudinho. Já o Vegearte é uma iniciativa que estimula a alimentação vegetariana e saudável de baixo custo. Esses são exemplos de projetos que fazem parte do Instituto Favela da Paz que, em 2018, está ganhando uma nova sede para acolher ainda mais iniciativas, impactando muito mais pessoas. “Os projetos são uma forma dos agentes periféricos se encontrarem e estarmos juntos. E isso virou um grande emaranhado de coisas boas”, brinca. “Eu sou desafiado todos os dias e isso me faz viver e me faz chegar onde eu quero chegar, isso me faz mudar o lugar onde eu estou”, finaliza Claudinho.

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