Nos últimos cinco anos, ergueram-se algumas pontes entre o ecossistema e a pesquisa acadêmica. Os indícios disso aparecem na criação de novos cursos sobre negócios de impacto social nas mais variadas universidades brasileiras, além do apoio para pesquisas e para estudos de caso.
Desempenhando um papel fundamental na orquestração do cenário acadêmico está o Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), um dos articuladores quando o tema é negócio de impacto. Em 2013, o instituto começou a rodar o Programa Academia, o qual visava fortalecer a produção de conhecimento e aumentar a atuação das Instituições de Ensino Superior brasileiras.
“O Programa Academia nasceu assim que o ICE assumiu a temática dos negócios de impacto. Nosso objetivo era de aproximar a universidade deste universo tanto para ajudar na conceituação do campo no Brasil, quanto para começar a estimular as pesquisas, aulas, atividades de extensão”, conta Adriana Mariano, gestora do Programa Academia. “O tempo inteiro, a gente tenta quebrar esta barreira da academia. Queremos que ela seja cada vez mais um ator dentro do ecossistema”, completa.
Formando a rede
Nos dois primeiros anos, a iniciativa limitou-se a formar uma rede de professores do Sudeste do país. Reuniu, a principio, representantes da FGV-SP, FEA-USP, Insper, ESPM, SENAC, Unicamp, FEI, EACH – USP, FGV-RJ e St. Gallen – SP. Esta primeira etapa contou com recursos do Fundo Latino Americano de Inovações em Economia de Impacto, da Fundação Telefônica Vivo e do Instituto Quintessa, que possibilitou a criação de editais internos para incentivar a produção dentro das universidades.
O estímulo desta primeira etapa gerou a produção de dois artigos, quatro pesquisas, onze estudos de caso e três competições. Também ajudou na institucionalização de dois grupos: o Núcleo de Medição para Investimentos de Impacto Socioambiental, do Insper, e o Núcleo de Negócios de Impacto Social, no âmbito do Centro de Empreendedorismo em Novos Negócios, da EAESP-FGV. A partir disso, os núcleos também têm sido propulsores da criação de disciplinas, como Empreendedorismo Social, no curso de graduação da EAESP-FGV.
Além disso, uma das estratégias definidas pela rede do Programa Academia foi a criação do Prêmio Academia ICE que chega, em 2018, a sua 5ª edição, oferecendo prêmios em dinheiro para trabalhos de graduação, mestrado e doutorado. “O prêmio tem crescido anualmente. A última edição teve aproximadamente cinquenta inscritos, mas o primeiro ano começou com onze. E, cada vez mais, os trabalhos vêm sendo mais específicos”, revela Adriana.
Em 2014, um novo apoiador entrou neste cenário, o gigante banco de investimentos J. P Morgan. Resultado disso: no ano seguinte o programa ampliou sua extensão, gerando mais investimento, desta vez por parte do Laboratório de Inovação do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o FOMIN. Hoje, o programa conta com 75 professores membros de todo o país que participam de learning sessions, webinars, trocam metodologias de ensino e estudos de caso, além de participarem de congressos nacionais e internacionais. A última edição do Fórum de Finanças Sociais, para se ter uma ideia, teve cinquenta professores inscritos.
“Acho que a principal forma de atuação da Academia é a interlocução. O professor fica muito sozinho em sala de aula com o aluno. A gente corre atrás de referências na internet, nos livros para tentar se atualizar, mas como é um tema muito novo, precisamos de interlocução entre os próprios professores e os setores”, conta Ruth Soriano, economista, professora do domínio adicional de Empreendedorismo há seis anos e, desde 2016, é coordenadora dos projetos de Negócio de Impacto da PUC-RJ. Disponível para os graduandos e com duração de um ano e meio, o curso aborda todo o espectro que envolve a criação de um negócio e dá a possibilidade do aluno encerrar sua passagem pela faculdade com um diploma adicional de uma certificação minor.
Expansão na oferta de cursos
Fruto desse esforço, foram publicadas quinze ementas de cursos nas seguintes universidades: UFRGS, UESC, SIT, Unicamp, Insper, PUC-RJ, Unisinos, UNA, UFMS, UDF, FGV, FEI e FEA. Apesar de ser o principal agente estourando a “espessa bolha acadêmica”, alguns cursos de negócios de impacto encontraram outras formas de dar seus primeiros passos. Um dos primeiros cursos a tratar o tema na universidade brasileira foi o da ESPM, criado em 2013 em parceria com o Yunus Business Centre. O curso de 120 horas e 10 semanas, expandiu-se rapidamente para a unidade carioca da ESPM, onde Rodrigo Carvalho é o coordenador.
Com sua quarta turma recém-formada, o curso já ajudou a encaminhar trinta e três projetos e costuma aglutinar três principais tipos de perfis de alunos. “Há as pessoas que estão em transição de carreira, pessoas oriundas do terceiro setor e quem está dentro de grandes organizações que estão próximas ao universo da responsabilidade social”, revela Rodrigo.
Ao longo do tempo, as motivações que levaram essas pessoas a se matricularem foram mudando e a questão do empreendedorismo como propósito ganhou mais espaço. “Claramente, do ano passado para cá, há uma maior tendência das pessoas quererem desenvolver seus próprios projetos como instrumento de transformação das suas próprias vidas. Isso sempre houve, mas nas duas últimas turmas este número aumentou 100%”.
“Não sou uma pessoa do meio do empreendedorismo social, mas é um futuro que não tem jeito de não acontecer. Por isso, comecei a buscar alguns cursos neste sentido” — Rachel milech
Não é só no Brasil…
Esta crescente onda de novos cursos sobre o tema é global. Universidades tradicionais norte-americanas como a Harvard e a Stanford oferecem cursos de pequena duração para executivos. Na primeira, o curso aplicado leva o título de Creating Shared Value: Competitive Advantage through Social Impact, o qual este ano acontecerá de 3 a 5 de dezembro. O valor da inscrição é de 6.500 dólares. Já a segunda universidade disponibiliza o curso Executive Program in Social Entrepreneurship, com duração de uma semana e custa cerca de 4.750 dólares.
Um exemplo desse movimento é a consultora Rachel Milech, que decidiu estudar o assunto fora do país. Entretanto, escolheu pela Universidade da Pensilvânia nos Estados Unidos para aprimorar seus conhecimentos. Ela uma dentre os três brasileiros cursando a cadeira Executive Program for Social Impact Strategy, com duração de oito meses na universidade americana. O curso existe desde 2015, sendo uma parte cursada presencialmente e outra à distância. Vale informar que quem faz o curso fica com créditos, caso queira fazer o curso de mestrado oferecido pela própria universidade.
“Não sou uma pessoa do meio do empreendedorismo social, mas é um futuro que não tem jeito de não acontecer. Por isso, comecei a buscar alguns cursos neste sentido”, comenta Rachel. “Pesquisando, achei que, num curso fora do país, eu teria acesso a pessoas de vários países e acabei escolhendo um com um bom programa e custo-benefício”.
Para quem não tem certeza de que está disposto investir cerca de 5.450 dólares, em média, numa inscrição dessas universidades, é possível experimentar uma versão gratuita do curso. O site Cousera oferece uma versão reduzida de quatro semanas, com carga-horária de 16 horas de estudo.