
No início de 2019, segundo levantamento realizado pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), o déficit habitacional (indicador de quantidade de cidadãos sem moradia adequada) no Brasil cresceu 7%, entre 2007 e 2017, e chegou a 7,78 milhões de moradias. Você pode ler mais sobre este estudo, aqui.
O déficit é calculado considerando variáveis, como a precariedade da moradia, a quantidade de famílias no mesmo domicílio, o valor do aluguel em face da renda per capta e o adensamento em dormitórios compartilhados. Pessoas com renda acima de quatro salários mínimos não são consideradas para cálculo do déficit habitacional, mesmo se usarem mais de 30% da renda com moradia.
A questão da moradia é uma das principais preocupações da Agenda 2030, a partir dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, e está diretamente ligada às estratégias que devem ser pensadas por empresas, ONGs e a sociedade como um todo para que se chegue a soluções a curto, médio e longo prazos.
A pandemia agrava ainda mais a situação da moradia no Brasil, com a impossibilidade de muitas famílias de manterem o aluguel em dia ou a dificuldade que as pessoas têm de respeitarem o isolamento social, devido à falta de uma moradia digna. Por isso, organizações como o Vivenda, o Moradigna e o FICA têm realizado planos emergenciais para continuar, de formas diversas, o trabalho junto às famílias por eles apoiadas.
Vivenda
O Programa Vivenda realiza reformas habitacionais em bairros do extremo Sul de São Paulo, com o foco em melhorias de moradias inadequadas. O Vivenda facilita o acesso às reformas e ao pagamento, parcelando os valores de projeto, mão de obra e material em até 30 vezes. O Programa já atendeu 5.600 pessoas e favoreceu mais de 1.600 reformas.
Sobre as ações que foram tomadas devido ao Covid-19, Fernando Assad, empreendedor social e idealizador do Programa, explica: “Paramos todas as obras para preservar os nossos executores parceiros, os pedreiros, bem como as famílias. Postergamos as parcelas dos próximos meses para as famílias que estão pagando seus empréstimos de reformas já feitas e ajudamos, com recursos adiantados, os trabalhadores para que executem as obras, de forma que os valores serão descontados futuramente”, O empreendedor salientou também a busca por crédito para manter a saúde econômica da empresa.
Além disso, o Vivenda conseguiu, por meio de doações de parceiros, o valor de R$100 mil, que foi destinado às famílias já cadastradas no Programa, para suprir bens de primeira necessidade. “Durante este tempo de isolamento e devido às restrições de circulação, estamos trabalhando na criação de uma plataforma nacional, que pretende ser um espaço de facilitação para outras pequenas organizações que estão na luta em ações semelhantes às que fazemos”, comenta Fernando. “O objetivo é disponibilizar, gratuitamente, informações para que estas organizações tracem um caminho mais linear”, completa.
Entre os apoiadores do Vivenda, o Bloco do Beco está com uma campanha de apoio aberta até o dia 28 de maio. O objetivo é apoiar ONGs que atuam nas periferias de São Paulo. O valor arrecadado será distribuído às famílias em situação de risco para a compra de cestas básicas e itens de primeira necessidade.
Fundo FICA
O FICA é um fundo imobiliário de propriedade coletiva.

O público-alvo para o atendimento são famílias de baixa renda. Dessa forma, O FICA avaliza a diversidade, a permanência e a segurança das comunidades no território. O fundo adquire imóveis e os torna acessíveis, de modo a construir modelos alternativos ao mercado imobiliário tradicional.
Durante a pandemia, o FICA tem trabalhado na mobilização das redes para auxiliar projetos e instituições sociais ligados à moradia e à cidade. O Fundo Emergencial FICA em Casa foi criado para receber os valores, debater e decidir coletivamente quem vai receber os recursos, e destinar os valores recebidos a instituições ligadas à moradia urbana. Preferencialmente, são atendidos coletivos pequenos, que lidam diretamente com problemáticas, como moradia adequada e aluguel justo.
A primeira doação aconteceu no dia 10 de abril e o plano é doar semanalmente uma parte do total arrecadado para uma instituição ou um coletivo em situação de emergência durante oito semanas. Cada instituição receberá o valor de R$ 12.000,00 e a destinação dos recursos é decidida por um conselho, que se reúne semanalmente e à distância. Os critérios que definem quem receberá o recurso também são decididos semana a semana. Para cadastrar-se e concorrer aos recursos, a instituição deve preencher um formulário disponível neste link. As sugestões de entidades serão analisadas coletivamente pelo Conselho Curador.
Moradigna
O Moradigna é um negócio social que busca mudar a vida de milhões de brasileiros que moram em situação de insalubridade. Com atuação em toda a Zona Leste de São Paulo, em Manaus e no Rio de Janeiro (em Tabajara, Santa Marta, Bangu e Realengo), já impactou mais de duas mil pessoas e reformou mais de 500 moradias.
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Com as obras de reformas paradas, a equipe está trabalhando de forma remota e aproveitando o tempo para tirar do papel um projeto de reforma virtual, que pode ajudar muitas famílias a melhorarem suas condições de vida, que é uma urgência em tempos de isolamento social.
O Reforma Virtual será uma solução para que a pessoa faça a reforma de forma autônoma e, num primeiro momento, vai oferecer o serviço para profissionais da construção civil para que possam fazer a reforma de suas próprias casas, com orientação do Moradigna.
Moradia e Política: conheça também a UNMP
A União Nacional por Moradia Popular foi fundada em 1989, com a articulação para a coleta de assinaturas para o primeiro Projeto de Lei de Iniciativa Popular realizado no Brasil. Em 2005, este PL deu origem ao Sistema, Fundo e Conselho Nacional por Moradia Popular (Lei 11.124/05). A atuação da organização articula e mobiliza movimentos de moradia, entendendo esta como um direito. Desse modo, a concentração do trabalho da UNMP se dá em movimentos que atuam em áreas de favelas, cortiços, sem-teto, mutirões, loteamento e ocupações. Como resultados destas três décadas de mobilização, cerca de 30 mil moradias foram construídas em mutirões, além de prédios reformados para fins habitacionais e favelas urbanizadas. A organização participou ainda da construção de Políticas Públicas voltadas à habitação, como o Programa Minha Casa Minha Vida – Entidades. A UNMP também se mobiliza em ações, como distribuição de cestas básicas, neste contexto pandêmico. A União dos Movimentos de Moradia de São Paulo (UMM-SP), por exemplo, está com canal aberto para doações aos que desejam ajudar na compra destas cestas que serão destinadas às ocupações urbanas de prédio e terra favelas e mutirões autogestionários.
Para conhecer mais as discussões sobre moradia, periferia e desigualdades diante do Covid-19, você pode acessar o diálogo “Do emergencial ao longo prazo: pensando a cidade para além da pandemia”, organizado pela Rede Nossa São Paulo e pela Fundação Tide Setubal. Participaram do diálogo: Jorge Abrahão (Rede Nossa São Paulo), Maria Alice Setubal (Fundação Tide Setubal), Vagner de Alencar (Agência Mural) e Evaniza Rodrigues (UNMP).
Créditos imagem de capa: Instagram do Fundo FICA.