Quem pensa em empreender, abrir um negócio ou uma sociedade, começa com muitas dúvidas: o tipo de negócio, a existência de um ponto de venda fixo ou não, o investimento inicial, os canais de divulgação,a distribuição e, talvez um dos aspectos mais importantes, sobre qual regime jurídico seguir.
As tão conhecidas ONGs (Organizações Não Governamentais) podem ser constituídas juridicamente? Quais são as possíveis limitações de doações e recursos para cada tipo de regime escolhido? Existem modalidades de negócio que causam mais ou menos impactos ou podem ser consideradas inovadoras? Em outras palavras, o regime jurídico escolhido pode determinar o quanto um negócio é ou não inovador e o quanto é capaz de gerar impacto positivo?
“Se o regime de negócios gera lucros ou não, se trata de uma Organização Social ou de uma Fundação ou mesmo de uma micro ou pequena empresa, o que garantirá o impacto social gerado é o tipo de serviço oferecido à comunidade”, diz Flavia Regina de Souza Oliveira, sócia do escritório Mattos Filho, especialista em estruturação de negócios sociais, que dedica-se, exclusivamente, ao Terceiro Setor e à responsabilidade social.
A seguir, conheça alguns dos verbetes bastante recorrentes a organizações e negócios no ecossistema de impacto.
Toda e qualquer organização societária sem fins lucrativos e que não tenha patrimônio deve ser constituída juridicamente como associação. Trata-se de pessoas que se unem para constituir algo sem fins lucrativos e com temática livre. A associação pode prestar serviços à comunidade ou ser constituída para benefício dos próprios associados, como um clube. Assim, o termo ONG ou instituto se refere a uma associação, ou seja, ONG ou instituto são nomes fantasia, sem definição jurídica. Toda ONG, organização ou instituto que não visa a geração de lucros e não tem um patrimônio inicial é, juridicamente, uma associação.
Para que se constitua uma fundação é necessário que haja um patrimônio inicial, ou seja, um patrimônio dotado de personalidade jurídica. A fundação depende de uma pessoa física ou jurídica e pode ser constituída em causa mortis, quando alguém deixa parte de sua herança com fim específico de serviço à comunidade. Além disso, a fundação é zelada pelo Ministério Público e, por isso, tende a existir de forma perene.
Organização Não Governamental
Trata-se de um nome fantasia, um jargão. Ou seja, uma ONG é sempre, juridicamente, uma associação.
Organização Social
A OS é uma qualificação dada pelo poder público seja para uma associação, seja para uma fundação com objetivo de gerir equipamentos públicos. Não são todas as organizações que podem ser qualificadas como OS, mas, sim, aquelas que realizam atividades voltadas à educação, cultura ou saúde. Porém,isso pode variar entre legislação estadual ou municipal. Em São Paulo, por exemplo, uma organização só pode ser qualificada como organização social se for da área da saúde, cultura ou meio ambiente.
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
Trata-se de um tipo de qualificação muito interessante concedida pelo Ministério da Justiça. As organizações poderiam firmar com o Poder Público uma forma de contratação diferente. As OSCIPs poderiam remunerar seus dirigentes, por exemplo. Porém, hoje isso não faz mais sentindo, pois qualquer organização social pode remunerar os dirigentes e garantir outros benefícios, mesmo não sendo uma OSCIP, devido à legislação vigente.
Organização da Sociedade Civil
A OSC é uma nomenclatura que nasceu devido à lei que ficou denominada como Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil. Trata-se da Lei 13.019, de 2014. Algumas organizações sem fins lucrativos, organizações religiosas ou sociedades cooperativas podem ser reconhecidas como OSC, mas isso não altera o modo de funcionamento, nem garante nenhum benefício.
Micro Empreendedor Individual
Com o MEI, a pessoa física tem a possibilidade de ter um registro do CNPJ por meio da Lei n°128/2008. O objetivo é formalizar o pequeno empresário individual. Para se encaixar dentro da categoria é preciso: ter faturamento de até R$ 81.000,00 por ano; não ser sócio ou titular de outra empresa; e ter no máximo um empregado.
Diferente dos outros tipos de organização, o MEI pode gerar lucro, dentro do faturamento de R$ 81.000 mil reais por ano. O procedimento de abertura pode ser feito inteiramente pela internet.
Há ainda as Cooperativas, que são organizações constituídas por membros de determinado grupo econômico ou social com objetivo de desempenhar determinada atividade em benefício comum.
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Qual o futuro?
Luciana Brasil, diretora de marketing da Impact Hub, afirma que o contexto atual exige novos modelos de negócio. Afinal, os negócios que buscam impacto positivo também precisam se adaptar a essa nova dinâmica. Para ela, a pandemia antecipou o futuro.
“As grandes organizações passaram a rever conceitos e atuações para entregar muito mais do que só o produto ou o serviço. Eles precisaram apresentar envolvimento com as pessoas e o planeta. Os negócios de impacto positivo tiveram que acelerar e escalar as suas entregas para um mercado ávido pelas suas soluções”, explica Luciana.
E sobre a captação de recursos?
Uma vez criada, a associação deve criar uma rede de pessoas que compartilham a sua causa e que comecem a se conhecer e se apoiar. “A estratégia de captação de recursos deve emergir dessa rede de pessoas apaixonadas pela causa. A partir disso, pode-se explorar estratégias de captação recorrente junto a pessoas físicas (várias plataformas como a Doare, facilitam esse processo) e organizações (empresas e governo) em editais (como o Prosas) e por meio da rede de relacionamentos dos integrantes da associação”, comentou Luciana.
Dicionário da Impact Hub
O processo de criação do Dicionário de Impacto surgiu após a edição de 2018 do Fórum de Finanças Sociais. Segundo Luciana, muito se falou sobre “estourar as bolhas” e sobre envolver cada vez mais pessoas e organizações no ecossistema de impacto.
“Para que isso aconteça, a comunicação tem um papel fundamental. Os termos e definições são muito específicos do nosso ecossistema.
A ideia do dicionário é entender para se envolver”,
explica a diretora.
“Então, sendo um hub, convidamos várias personalidades do segmento de impacto para definir termos e tentar democratizar o entendimento. Buscamos expressões que precisavam ser explicadas, selecionamos os atores e compilamos em um material de acesso gratuito a fim de alcançar o objetivo”, completa Luciana.
Decidi abrir uma associação, o que fazer?
“No caso da associação, é preciso que duas ou mais pessoas elaborem um documento que se chama Estatuto Social – as regras obrigatórias e presentes no artigo estão presentes no artigo 54 do Código Civil –, que deve ser assinado por todos os associados fundadores e, uma vez feita a assembleia geral de constituição, com a aprovação de documento, ele deve ser levado ao Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas para que a Associação obtenha o CNPJ”, explica Flavia.
Já no caso da fundação, Flavia explana que é necessária a realização de vários atos formais. Num primeiro momento, no caso de criação de uma fundação por ato jurídico inter vivos, deve ser lavrada uma escritura pública para dotação do patrimônio inicial, que deve ser feita no Cartório de Notas. A fundação também pode ser criada por ato jurídico causa mortis, ou seja, por meio do testamento. Na sequência, deve ser elaborado o Estatuto Social, que deverá ser submetido para aprovação do Ministério Público, para posteriormente ser levado também ao Cartório de Registro Civil de Pessoas Jurídicas para registro e consequente obtenção de CNPJ.
Para Luciana, o primeiro passo é investigar o desafio que se quer solucionar. “A partir disso, você pode buscar referências de modelos de negócios para solucionar aquele desafio e ir à rua, testar, conversar com as pessoas que se beneficiariam com a sua solução. Essa interação com as pessoas na ponta é importantíssima para que desenvolva uma solução que realmente faça sentido. Para fazer tudo isso, é preciso contar com uma rede de apoio”, finaliza.