O FORImpact – Family Offices de Impacto é uma iniciativa do ICE e da Impactix Consulting, criada com o intuito de inspirar famílias a investirem em negócios de impacto, de forma a promover mais experiências nesse campo. Desse modo, tais famílias e seus escritórios, com a aproximação ao ecossistema de impacto, podem ficar mais confortáveis para aumentar a quantidade de investimentos no setor.
Anna Carolina Aranha, fundadora da Impactix Consulting e cofundadora da Pipe.Social, é uma das articuladoras do programa, que visa prover fomentos a negócios com o propósito/de impacto em suas fases iniciais. “Cada uma das doze famílias [que fazem parte do FORImpact hoje] investiu por volta de R$100 mil dentro das seis empresas selecionadas. Tanto numa modalidade de dívida simples quanto dívida conversível”, afirma Aranha. Dos R$ 1,2 milhão, 15% foram utilizados para pagar a estrutura do FORImpact e o restante foi destinado às seis startups selecionadas (Sumá, Pluvi.On, VerBem, Fofuu, Gove e Pickcells), de modo que cada uma das empresas recebeu cerca de R$ 200 mil. Ela destaca ainda que, a partir dos estudos e mapeamentos desenvolvidos sobre o ecossistema, como o Mapa de Negócios de Impacto da Pipe.Social, verificou-se um gap no setor. “Sabemos que praticamente 40% desses negócios necessitam muito pouco para conseguir dar os primeiros passos dentro daquilo que a gente chama de vale da morte das startups. Elas precisam de R$ 200 mil para conseguir testar suas soluções, contratar time e colocar o piloto no ar – justamente para desenvolver as soluções de impacto socioambientais”, comenta Aranha, que completa:
“Há os fundos que têm capital para alocar, mas eles olham empresas maiores para investir 5, 10 ou 20 milhões. Ao mesmo tempo, a maioria das empresas de impacto está no cenário inicial da jornada, não conseguindo chegar ao estágio de maturidade nem a ponto de obter o ticket de investimento de 5, 10 milhões”.
Desse cenário vem a discussão entre o ovo e a galinha. “Os fundos reclamam que não há no pipeline empresas [com propósito] para investir, não tem um volume substancial dessas empresas, mas, ao mesmo tempo, não há quem invista nessas fases iniciais da jornada para que esses empreendimentos consigam passar pelo vale da morte e num volume de investimento dos fundos no Brasil”, explana a articuladora. No FORImpact, explica Aranha, a intenção é, portanto, unir essas duas pontas do ecossistema: aumentar o número de investidores de impacto e cobrir o gap de tickets menor em investimentos early stage, que, realmente, têm maior risco. Conheça mais o FORImpact e as ações e trocas das family offices com o ecossistema de impacto.
AUPA – Em qual parte do processo vocês estão hoje?
ANNA CAROLINA ARANHA – O FORimpact foi desenvolvido em 2018, sendo lançado em agosto. Estamos dentro de uma fase que já fizemos e passamos pela seleção dos negócios para investir: já fizemos os investimentos, os valuations, as análises e agora estamos justamente na fase de ver os planos de ação dessas startups e fazer o monitoramento dessas investidas. Na verdade, o FORImpact, junto com esse investimento, tem uma camada também de capacitação, onde também temos um conteúdo que aborda desde a formação de tese de investimento das famílias até a análise dos negócios inclusive dos principais setores de impacto, até também entender a medição de impacto, os veículos e as possíveis estruturas de investimento. Então, todos esses tópicos são abordados ao longo de dezoito meses desse programa, e esses investimentos vão ser acompanhados durante cinco anos com reports de monitoramento periódicos para que as famílias possam acompanhar esses investimentos.
AUPA – Como tem se dado a aproximação das famílias e dos family offices junto aos negócios de impacto?
ANNA CAROLINA ARANHA – Não há dúvida de que as novas gerações, sobretudo a geração millennials, já veio com outro chip. É uma geração que busca mais propósito e sustentabilidade. Cada dólar investido e gasto é um voto por um mundo no qual ela quer viver. Então, todo esse contexto de sustentabilidade, propósito, impacto ambiental, social e questão ética vem com muito mais força nessas novas gerações. E diferente das antigas, em que havia a mentalidade de: “Bom, vou ganhar dinheiro deste lado com a indústria, não importa o que ela está fazendo, poluindo ou não prestando atenção ao entorno, nos empregados na cadeia, enfim, pra poder, depois, acumular dinheiro e doar para uma filantropia”. A cabeça agora das novas gerações é como a gente consegue construir negócios do zero, que sejam já sustentáveis e que tragam um impacto maior ao mundo. Então, estamos vendo que essas famílias, principalmente os membros das novas gerações, vêm olhando com mais carinho para esses negócios de impacto. E não só sobre a questão de alocação, mas, muitas vezes, o foco de tentar suportar, ajudar, sentar em conselho, abrir networking e redes de oportunidade para essas empresas. Então, está sendo uma experiência muito bacana fazer esse coinvestimento de doze famílias, tentando se juntar para ajudar esses negócios a crescer e abrir novos canais, ter suporte financeiro, um suporte estratégico delas – elas têm a parte além de investimento financeiro, que é o suporte na mentoria desses negócios. Então está sendo superinteressante.
AUPA – Quais são os seis negócios de impacto selecionados pela FORImpact?
ANNA CAROLINA ARANHA – Há a Fofuuu, um software multiplataforma para ajudar crianças com problemas fonéticos, complementando a fisioterapia de fonoaudiologia. Hoje o governo não consegue suprir essa demanda, a população localizada na baixa renda não consegue pagar fonoaudióloga, então eles ofereceram um software/um sistema muito fácil, barato, lúdico e interativo para que as crianças possam fazer aqueles exercícios de fono.
Já a Pickcells é uma solução, um scanner na verdade, para detectar doenças negligenciadas, de uma forma muito rápida e barata. É um aparelho pequeno que pode ser usado de forma itinerante, porque é móvel. Você simplesmente tira o sangue, coloca algumas plaquetas à mostra, sobe para a nuvem e desce já com o diagnóstico rápido de doenças hoje negligenciadas, como esquistossomose e doenças comuns em pessoas em situação de baixa renda que os grandes laboratórios ou não têm interesse em desenvolver soluções para isso ou cobram caríssimo por elas.
A Pluvi.On é uma solução de estações meteorológicas pequenas, reduzidas, leves e mais baratas, para melhorar a acuracidade e poder avisar moradores, principalmente de áreas vulneráveis com chuvas e deslizamentos, quando houver alguma ocorrência meteorológica, para que eles possam se precaver, preparar e reduzir os danos e as perdas que essas famílias têm com as grandes tempestades.
A Sumá é uma plataforma que conecta produtores familiares com uma produção mais saudável e orgânica. Os pequenos produtores são muito achatados dentro da cadeia, a plataforma os conecta com os consumidores e, principalmente, B2B locais, como restaurantes e hotéis, reduzindo o custo para quem compra, aumentando as margens e a qualidade, tornando o comércio mais justo dentro dessa cadeia.
A VerBem faz óculos com valor acessível e dentro de uma tecnologia de barateamento do produto. A solução ainda permite que a venda de um modelo mais caro financie doações de produtos mais baratos, realizadas em grandes mutirões.
E há também Gove, que é uma plataforma que ajuda os governos, principalmente de municípios, a ter uma gestão financeira mais inteligente, gerando muita economia para as cidades, de uma forma bem inteligente, através da plataforma.
AUPA – Como vocês percebem a troca de ideias/saberes entre o ecossistema de impacto e as culturas que as famílias já têm em seus próprios negócios?
ANNA CAROLINA ARANHA – É muito interessante, não só pelo FORImpact, mas também pela experiência na Impactix, de dez anos suportando famílias nessa conexão com negócios de impacto. É gratificante porque, muitas vezes, acabo vendo a transformação que se pode gerar dentro de uma família: você criar uma tese de investimento, entender uma espinha dorsal comum de interesses da família, ajudar negócios de determinado setor ou de determinado tipo de impacto, que está relacionado à família, muitas vezes juntando e trazendo uma união familiar ao redor dos desafios que esses investimentos e essas empresas trazem. A gente também já recebeu muito feedback do aprendizado, que é do ponto de vista até empresarial, acerca da agilidade das startups para os grandes negócios que as famílias tocam, além da leveza que elas trazem, da rapidez com que tomam decisões – e tem que tomar pela fragilidade do negócio. Então, vemos que é realmente uma troca muito inteligente, não só as famílias ajudando esses negócios de impacto, mas também os negócios de impacto ajudando tanto na união das famílias, na satisfação de poder fazer um mundo melhor, com também algumas práticas e inspirações de agilidade e inovação.
AUPA – Há alguma predileção pelo aporte aos negócios que dialoguem com tecnologias? Ou mesma a ideia de ter uma fintech própria do FORImpact?
ANNA CAROLINA ARANHA – Quando a falamos de impacto, é inegável dizer que a questão da tecnologia traz uma possibilidade enorme de escala. Então, quando falamos em potencial de transformar a vida de milhões, com soluções que realmente sejam escaláveis, é muito difícil que isso não passe pela questão de tecnologia. E a gente vê que cada vez mais o mercado vem avançando com relação a isso. Sobre o FORImpact ter uma fintech: o propósito do FORImapct é trabalhar muito tailor-made com essas famílias para capacitar essas grandes fortunas e essas novas gerações para essa cabeça [voltada ao impacto]. A princípio, a curto e a médio prazo, acho que não faz sentido ter uma fintech do FORImpact agora.