Entre empreendedores e investidores, há organizações que são fundamentais para o ecossistema de impacto: são as aceleradoras e as incubadoras – ou organizações de apoio ao empreendedor, como alguns preferem chamar. Elas são responsáveis por apoiar negócios, seja em fase de iniciação, intermediárias ou mesmo negócios que já estão há certo tempo no mercado, mas precisam de auxílio tecnológico ou ainda pensar perspectivas diferentes.
Mas, como fazer com que aceleradoras e incubadoras interessem-se, sempre mais, em investir em negócios de impacto? Vivian Rubia Ferreira, coordenadora do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), destaca o papel destas organizações no atual momento social, econômico e político do Brasil.
“Temos, de um lado, as organizações que oferecem recursos financeiros e, de outro, organizações ou empreendimentos que precisam dos recursos. Para que estes recursos cheguem às demandas, temos organizações intermediárias. Elas, por sua vez, oferecem organização, serviços, conexões em rede e apoiam o desenvolvimento tecnológico. Assim, aceleradoras e incubadoras são pontes”, explicou Vivian.
O ICE desenvolve também trabalho especializado com aceleradoras e incubadoras em todo território nacional. Os resultados desta iniciativa podem ser conferidos na publicação Boas práticas de incubação e aceleração de impacto (2020).
Para Vivian, a questão do investimento dessas organizações de apoio em negócios de impacto depende de uma compreensão mais ampla sobre uma agenda social e ambiental internacional. “O aumento nos montantes investidos em impacto demonstram um avanço neste sentido, embora saibamos que é preciso mais no Brasil, sobretudo no que se refere às questões ambientais”.
Thaís Nascimento, por sua vez, salientou que o GIFE, associação dos investidores sociais do Brasil, oferece material de apoio e subsídios para que as empresas percebam o potencial dos negócios de impacto, mas, cabe à cada organização decidir o momento adequado para investir neste tipo de negócio. Enquanto coordenadora de fomento e inovação no GIFE, Thaís comentou que o principal objetivo é abrir o debate. “Oferecemos subsídios de qualidade e que sejam relevantes para que os investidores possam entender esse universo e que possam ser utilizados também pelas organizações intermediárias [aceleradoras e incubadoras]. Nosso objetivo é abrir o debate e promover encontros significativos. Por isso, estamos focados em eventos, promoção e divulgação de dados”.
Para Fábio Deboni, diretor do International Center for Tropical Agriculture (CIAT) e coordenador da Rede Temática de Negócios de Impacto do GIFE, as aceleradoras convencionais têm começado a descobrir a agenda do impacto pouco a pouco. A questão dos recursos talvez seja um dos principais motivos e, obviamente, está ligada ao fator financeiro. “Há desafios de ordem metodológica neste momento, como o virtual versus presencial improvável.
São desafios inúmeros que os próprios negócios de impacto estão enfrentando com a crise” explica. “São muitos desafios para ser/estar como sendo uma aceleradora de impacto, ainda que o tema ‘impacto’ esteja em alta e que pareça ter vindo pra ficar”, completa o executivo.
Ainda segundo Fábio, em âmbito internacional os recursos vêm de três fontes principais: recursos públicos, agências multilaterais (como a União Europeia) e fundações (filantropia). Mas, em âmbito nacional, a parceria de incubadoras e aceleradoras com institutos e fundações tem sido um eixo importante de receita, via projetos conjuntos, parcerias e programas de aceleração. “Entretanto, fazem falta os outros dois pilares por aqui”, apontou.
No caminho certo
Em 2019, a Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec) publicou o Estudo de impacto econômico: segmento de incubadoras de empresas do Brasil, em parceria com a Cooperação Técnica entre o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O objetivo foi realizar um mapeamento dos mecanismos de geração de empreendimentos inovadores, incluindo a identificação e a análise dos impactos das empresas apoiadas
O documento identificou 57 aceleradoras – a maior parte encontra-se nas regiões Sudeste e Sul do Brasil, sobretudo em São Paulo. Em 2020, o Relatório de Investimento na América Latina publicado pela Aspen Network of Development Entrepreneurs (ANDE), mostrou que os investimentos no setor estão crescendo significativamente no Brasil e quase dobraram nos dois últimos anos (2018-2019), em relação ao biênio anterior: de US$343 milhões foi para US$785 milhões, segundo a publicação.
Atuação das aceleradoras durante a pandemia
Inúmeras ações foram realizadas durante a pandemia para minimizar as perdas dos empreendedores de impacto. O ICE, por exemplo, desenvolveu o “Elo de impacto” e apoiou 12 iniciativas de 23 organizações com doações para projetos que fomentam empreendedores da base. “Esses negócios foram escolhidos a partir de um levantamento da ponteAponte. Percebemos que eram iniciativas genuínas, o que é muito importante para nós. Ou seja, ver como essas organizações estão próximas dos negócios, sobretudo, em momentos de crise”, destacou Vivian, coordenadora do ICE.
Fábio Deboni, por sua vez, ressaltou que, assim como qualquer organização, as aceleradoras e incubadoras têm tentado se reinventar durante a pandemia, buscando repensar suas estruturas de custos e ajustar seus projetos num formato virtual. “Sobrevivência, manter relevância, ampliar atuação em âmbitos temáticos e regionais, buscar especializações possíveis (como foco em certos tipos de estágio ou maturidade dos negócios ou em certas teses de impacto), dentre outros, são movimentos que já eram percebidos antes da pandemia e que, com ela, talvez tenham se intensificado”, ressalta o executivo.
A ANIP realizou rodas de conversas on-line para inspirar e mobilizar outros espaços e pessoas, além do acompanhamento exclusivo por seis meses junto do Empreende Aí e do Fundo Volta por Cima.
“Durante a pandemia diversos empreendimentos não conseguiram microcrédito e acreditamos que investir neste setor – com um recurso semente – é de fundamental importância para que o empreendedor ou empreendedora cresça. É claro que, posteriormente, o objetivo é que esses empreendedores consigam acessar outras formas de investimento, mas neste momento compreendemos que é necessário um investimento múltiplo, utilizado tanto para o pessoal, quanto para o equipamento ou o marketing”, explica Fabiana Ivo, da ANIP.
Com o Programa de Aceleração, a PPA apoiou os empreendedores e as atividades de capacitação passaram a ser realizadas de madeira virtual. “Além disso, foi mobilizado um fundo emergencial de capital de giro de R$136 mil para os empreendedores, além de um programa de mentorias especializado para aumentar o apoio durante a crise”, destaca Augusto Corrêa.
A PPA também desenvolveu uma iniciativa voltada à resposta à Covid-19 na Amazônia, a PPA Solidariedade. “USAID, NPI Expand, PPA e SITAWI Finanças do Bem se uniram para criar uma parceria para ajudar a combater a Covid-19 no Brasil. Trata-se de uma iniciativa que engaja o setor privado em parcerias estratégicas para alavancar soluções inovadoras e escaláveis para fortalecer resposta rápida às emergências e ao combate ao Coronavírus ”, exemplifica o secretário executivo da PPA.
Com aporte inicial de R$10,6 milhões da USAID e da NPI Expand, a parceria buscou também alavancar recursos com parceiros do setor privado como Alcoa, Bank of America, Beraca, Cargill, Caterpillar, Fundo de Sustentabilidade Hydro, Mineração do Rio do Norte, Suzano e Vale, que contribuíram com cerca de R$18,2 milhões para as ações.
A Artemisia também realizou diversas ações durante a pandemia, como o fundo emergencial “Volta por Cima”, que apoia negócios de impacto que atuam em periferias. A iniciativa é resultado da aliança entre o Banco Pérola e a ANIP e apoia 50 negócios periféricos e com impacto direto nas periferias e em pessoas em situação de vulnerabilidade social.
O fundo emergencial “Volta por Cima” conta com doações feitas pelas seguintes organizações: Potencia Ventures, Fundação Arymax, Instituto Humanize, Fundação Tide Setubal, Instituto Vedacit, Votorantim Cimentos, Tigre e Instituto Carlos Roberto Hansen (ICRH), Gerdau, Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), Instituto C&A, Fundação Telefônica Vivo e INSEAD Alumni Association Brazil.
“Este cenário da crise tem despertado uma série de movimentos que mostram que os negócios precisam responder às demandas sociais e ambientais. São muitos desafios, sobretudo nas áreas da Saúde, da Educação e da agenda ambiental. Pensar em um mundo de empreendimentos desconectados dessa realidade significaria ficar de fora de um movimento global de novos modelos de negócio”, afirma Vivian, do ICE.