Milton Friedman, prêmio Nobel da Economia de 1976, tem uma frase conhecida que diz: “O negócio do negócio é o negócio”. O que ele queria dizer é que os negócios e seus executivos deveriam se concentrar no sucesso financeiro das empresas. Se fizessem isso, promoveriam o crescimento econômico do país e, com isso, estariam proporcionando um aumento do bem-estar da população.

Essa linha de raciocínio buscava combater a ideia da responsabilidade social das empresas. Segundo Friedman, se as empresas trabalhassem a questão da sustentabilidade socioambiental, elas tirariam o foco dos seus negócios e, consequentemente, gastariam recursos em atividades não essenciais e, com isso, seriam menos lucrativas, gerando menor eficiência de mercado.

Durante muito tempo, esse pensamento sobre os negócios prevaleceu. Até hoje, há ainda muitos entusiastas deste princípio. No entanto, na última década vem crescendo a consciência entre empresas, investidores e acionistas que, para se manterem lucrativas no longo prazo, as empresas precisam repensar seus impactos no planeta e na sociedade. Por exemplo, em sua carta aberta de 2020 Larry Fink, CEO da Black Rock, uma das maiores gestoras de investimentos do mundo, escreveu que o “Propósito é a engrenagem da lucratividade de longo prazo”.

Diversas ideias, movimentos, conceitos e teorias ganharam força com o fundamento de que os negócios deveriam assumir responsabilidades que vão além da maximização do retorno de seus acionistas. Valor Compartilhado, Capitalismo Consciente, Empresas B, Negócios de Impacto e, mais recentemente, ESG têm como pilar central a ideia de que as empresas devem buscar um equilíbrio entre todos os stakeholders, ou seja, entre todos os seus públicos de interesse e não apenas a centralidade no consumidor e no acionista. Em um mundo hiperconectado e com consumidores empoderados, usando as redes sociais como arena para manifestar seu ativismo, suas causas e insatisfações, as empresas são alvo de dúvidas, questionamentos e estão muito mais pressionadas pelos impactos que causam. 

Movimentos sociais como #metoo, #blacklivesmatter, #aquecimentoglobal e #covid19 passaram das ruas para as redes sociais e atingiram a discussão sobre o papel das empresas.

Com todos esses movimentos e tendências, as empresas passam a incluir em seus discursos essas preocupações. Várias estratégias e iniciativas começaram a ser implementadas para mostrar as ações das empresas na construção de um futuro melhor. O risco é cair em uma armadilha que se fixa apenas no discurso e não em ações efetivas de transformação do mindset e do negócio. Assim, o tão falado propósito aparece como um fim em si mesmo, sem se preocupar com perguntas básicas: por que estamos fazendo isso? Como vamos transformar essa realidade? Qual o papel de cada stakeholder, colaborador, líder e gestor neste processo?

Adotar o propósito por ser algo relevante e uma tendência de mercado não é suficiente. Se ele não vier estabelecido a partir de uma profunda reflexão dos princípios e valores da organização, sobre como ela opera com seus fornecedores, como compra, como vende, qual o impacto na cadeia completa até o descarte, corre o risco de mergulhar em um vazio de intenções sem constância nem coerência. Mais do que isso, podem se transformar em apenas ações sem impacto que reforçam a ideia de green washing ou social washing.

A questão que se coloca é: como dar, efetivamente, centralidade na transformação necessária para que possam ser feitas as mudanças sistêmicas que a sociedade precisa? Em 2018, John Elkington publicou seu recall do conceito de Triple Bottom Line, argumentando que as empresas adotaram o conceito de forma superficial sem buscar uma alteração mais profunda no sistema.

Não podemos mais tratar sustentabilidade, impacto e propósito como se fossem fins em si mesmos. São temas fundamentais para a construção de um futuro menos desigual e mais sustentável, que precisam ser abordados de uma forma mais profunda, entendendo qual seu real impacto. O objetivo desses conceitos e movimentos é causar uma transformação na forma de fazer negócios, liderar, produzir, distribuir e vender. O propósito não pode ser apenas um discurso vazio, mas uma alavanca para real transformação sistêmica.

Referência:
Elkington, J. (2018). 25 years ago I coined the phrase “triple bottom line”. Here’s why it’s time to rethink it. Harvard Business Review, 25. p. 2-5.

Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião de Aupa.

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