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Com a Firgun, empréstimo coletivo é ferramenta para viabilizar negócios periféricos

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Maria da Conceição precisava de um empréstimo de 4 mil reais. Ela é dona da Parça Progresso, uma  confecção de roupas no Capão Redondo que fornece para várias marcas locais. O objetivo do empréstimo era o de realizar uma reforma para ter mais espaço de trabalho. Quando 37 pessoas toparam cotizar o dinheiro, Maria fez a expansão de seu negócio e pagou o empréstimo com juros de 0,5% ao mês.

Isso aconteceu graças a uma plataforma de empréstimo coletivo para empreendedores em situação de vulnerabilidade, a Firgun. Este, aliás, é um dos 10 casos bem-sucedidos da fintech de P2P lending, que completa seu primeiro ano de operações, em setembro de 2018.

Em resumo, a plataforma permite que qualquer pessoa possa emprestar um “trocado” para ajudar negócios. Todos eles são indicados pelos parceiros que fazem capacitação empreendedora na quebrada, como A Banca, Empreende aí, Feira Preta e AfroBusiness.

“A gente quer que qualquer pessoa possa se tornar um investidor de negócios, gerando impacto na sociedade”, conta Lemuel Simis, um dos sócios da empresa. Essa visão nasce porque, segundo ele, o valor mínimo que alguém pode emprestar é de 25 reais.

Maria da Conceição precisava de um empréstimo de 4 mil reaispara reformar a Parça Progresso, uma  confecção de roupas no Capão Redondo.
Maria da Conceição precisava de um empréstimo de 4 mil reaispara reformar a Parça Progresso, uma  confecção de roupas no Capão Redondo.

Como se faz

Ao todo, já foram emprestados 80 mil reais de quase 150 investidores. O rendimento varia de acordo com o valor coletado. Se o empreendedor captar até 3 mil reais, não paga juros. Se captou entre 3 e 9 mil, paga 0,5% ao mês. Entre 9 e 15 mil reais, paga 1% ao mês. “Com a taxa Selic em 6.5%, paga-se, ainda, mais alguns títulos públicos”, relembra Lemuel.

No modelo de negócios da Firgun, a receita vem de uma taxa que incide sobre uma porcentagem do valor arrecadado, podendo chegar até 10%. “Se o empréstimo é de até mil reais não tem juros, nem taxa. Se o empreendedor capta mais do que 12 mil, a taxa é maior, é de 10% A gente quer inverter a lógica que existe hoje que é: de quem pode mais, paga menos”, diz Lemuel.

É neste modelo que os dois sócios da Firgun confiam para seduzir investidores. A metaé captar 200 mil de investimento (por 12% de equity, ou patrimônio líquido) e escalar a operação da empresa. Atesta a favor deles o fato de que até agora a taxa de inadimplência é zero. “É necessário um pouco mais de tempo para ter uma estatística mais robusta. Mas historicamente o microcrédito tem uma inadimplência baixa”, comenta Lemuel.

O caso da própria Maria da Conceição pode comprovar isso. Ela conseguiu quitar o empréstimo com três meses de antecedência e já fez outro financiamento de quase o dobro do valor do anterior. Além disso, ela se tornou também investidora da plataforma ao ajudar a cotizar os R$ 12 mil para Renato Gomes. Também empreendedor, ele precisava da quantia para a reforma de sua oficina de artesanato de móveis de materiais recicláveis, na Lapa, em São Paulo. Grana gerando grana.

O crédito, esse moderninho

O primeiro registro de uma operação de crédito foi há 6 mil anos, na cidade de Uruk, na Suméria. Ou seja, desde o início da civilização.

Mas o que leva alguém a emprestar dinheiro para outra pessoa? A resposta mais certa é: a confiança no futuro. Ambas as partes acreditam que os tempos que virão serão mais abundantes. Por isso, decidem fazer uma operação de crédito. A transação se baseia no otimismo de que um terá meios para quitação do crédito e o outro receberá o valor acrescido de juros.

A confiança gera crédito, crédito traz crescimento econômico real, o que fortalece a confiança e abre caminho para mais crédito. Um Ouroboros, a serpente que engole a própria cauda.

Pode parecer estranho pensar assim, mas o sistema de crédito como conhecemos é uma prática moderna. Mesmo o crediário existindo há muito tempo, somente há 500 anos que a humanidade começou a entender que era possível “construir o presente à custa do futuro”, As palavras são do historiador Yuval Noah Harari, no best seller Sapiens, sobre a trajetória da nossa espécie no planeta. Este mecanismo foi evoluindo tanto, que, hoje, existe mais crédito no mundo do que dinheiro de verdade.

Uma parte mais recente dessa evolução foi em 2005, quando surgiu a britânica Zopa. Ela foi a primeira empresa de peer-to-peer lending ou empréstimo coletivo. Sua função era, basicamente, articular o empréstimo entre pessoas não havendo a intermediação de instituições bancárias, com taxa de juros mais sedutora e mais rendimento.

Como em um crowdfunding, cada um oferece a quantia desejada e forma o valor do empréstimo solicitado. O modelo se popularizou com a crise econômica de 2008 e chegou ao Brasil anos depois como ótima alternativa aos juros altos. Com isso, a operação não fica refém do alto spread bancário brasileiro, oferecendo-se como alternativa mais barata.

Rastrear o invisível pode ser uma inovação social

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Tem sido bem interessante acompanhar o surgimento nessas eleições de várias soluções tecnológicas que ajudam o eleitor a votar. São empreendedores cívicos, cidadãos engajados, que vêm desenvolvendo ferramentas que dão mais transparência a campanhas e aos programas de cada candidato.

Para citar algumas dessas plataformas, temos a Calculadora de Afinidade Eleitoral 2018, da equipe d’O Iceberg. Trata-se de um site focado em assuntos da gestão pública desenvolvido por servidores públicos de carreira. A ferramenta compara suas posições políticas com as dos nove principais presidenciáveis. Os temas abordados são em economia, energia, proteção social, segurança e educação.

Outra iniciativa interessante é a da Lupa, primeira agência de fast-checking do Brasil. Sua equipe verifica o grau de veracidade de frases que contenham dados históricos, estatísticos, comparações e informações relativas à legalidade/constitucionalidade de um fato. Com base em dados, a plataforma tem classificado as frases ditas pelos candidatos em entrevistas e sabatinas como verdadeiras, falsas ou exageradas.

Tem ainda a Match Eleitoral, para ajudar na escolha de deputado federal, desenvolvido pela Folha e o Instituto Datafolha. A “Tem Meu Voto” é outra, que será lançada no dia 10 de setembro. E estes são apenas alguns exemplos.

Meu objetivo não é chamar a atenção para as tecnologias, mas para o processo de transparência e confiança que pode apoiar na resolução de problemas sociais e ambientais. Esse é um tema que tem gerado muitas oportunidades para empreendedores de impacto, não só na esfera pública, mas na privada também.

Alguns setores produtivos como a mineração, o agronegócio e a moda são os grandes vilões da poluição e também os que têm mais casos de condições precárias de trabalho no Brasil. Um grande desafio nessas indústrias é que suas atividades são muito pulverizadas, o que dificulta rastrear e dar mais transparência à sua cadeia produtiva. Mas o fator chave, sem dúvida, é mudança do modelo mental das lideranças, que vai estimular e permitir o avanço em novas soluções para problemas tão complexos. Eles precisam se convencer de que abrir os dados da empresa, suas fragilidades e suas ações para contornar os grandes desafios vai gerar confiança nos consumidores e na sociedade.

Só na indústria brasileira da moda, 1,2 milhão de pessoas trabalham de forma ilegal, isso significa 46% de toda a mão de obra do setor. As confecções têm 114 mil crianças e adolescentes trabalhando. São dados da Oxfam Brasil, organização que trabalha para reduzir as desigualdades.

Bem, a vontade genuína da indústria em ser mais transparente é fundamental para mudar esse cenário. Mas o desafio de conhecer a fundo fornecedores, suas práticas, rastrear toda uma cadeia de valor também traz um mar de oportunidades para empreendedores engajados em co-criar inovações sociais.

As tecnologias vem agregar valor a intenções verdadeiras de empreendedores em ajudar o cidadão a votar de forma mais consciente. Isso é uma baita contribuição. Da mesma forma, pensar e desenvolver projetos com setores com passivos ambientais e sociais tão significativos pode beneficiar indiretamente o elo mais frágil e invisível dessas cadeias.

Projeto Semente inicia sua terceira formação de empreendedores

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Chegando à sua terceira edição, o projeto Semente iniciou uma nova turma no dia 3 de setembro, em Itaquera. Após formar empreendedoras e empreendedores nas regiões da Zona Sul e Centro de São Paulo, o projeto parte para sua primeira turma na Zona Leste da cidade.

A formação compreende 10 aulas presenciais. Além disso, os empreendedores terão acesso a uma plataforma EAD com a qual poderão se aprofundar em temas relacionados ao empreendedorismo.

No final da formação, os empreendedores que mais se destacaram receberão uma mentoria especializada com profissionais de diferentes áreas.

O projeto é uma co-realização do CIEDS e o Empreende Aí, com o apoio da Fundação Arymax e Bancadão.

Corporações testam negócios de impacto por meio de suas Fundações e Institutos

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Um dos desafios do ecossistema de impacto no Brasil continua sendo trazer a grandes corporações a discussão e a tese de impacto positivo. Um dos pontos nevrálgicos desta discussão está na capacidade, ou não, dessas empresas mudarem a chave de compreensão. Como corporações podem incluir o impacto socioambiental positivo na sua cadeia de valor? Ou até mesmo desenvolver novos produtos e serviços balizados por esse novo propósito?

Um dos cases mais conhecidos, neste sentido, continua sendo da água AMA, produzida pela Ambev. O total do lucro com a comercialização das garrafas de água são convertidos para projetos de acesso à água potável no semiárido brasileiro. Atualmente, o lucro com essa operação passa dos R$ 2,6 milhões, segundo a Ambev.

Um longo caminho

A aproximação de grandes empresas a este ecossistema, no entanto, ainda é feita com cautela. Neste sentido, é possível fazer um paralelo sobre a relação de negócios de impacto com a filantropia. A hipótese  é de que esses empreendimentos não são substitutos do terceiro setor, embora existam exemplos de ONGs que tenham migrado para modelos de negócios.

Semelhantemente, não há a expectativa de que gigantes corporativas se convertam para negócios de impacto. Pelo menos é essa a análise de Graziela Comini, professora da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP).

“Elas têm um papel muito mais de fomento, portanto. É importante pensar em contratar fornecedores locais para estimular inovações que as grandes não conseguem criar, justamente por serem grandes”, comenta Comini.  “Essa seria um meio de lidar com alguns problemas que as empresas têm na sua cadeia, como reciclagem, por exemplo. Há soluções para essas questões em negócios de impacto, que podem ser contratadas.”

A sugestão de Comini é uma das presentes no manual Oportunidades para Grandes Empresas: Repensando a forma de fazer negócio e resolver problemas sociais. A publicação é fruto de uma parceria do Sense-Lab com a Aliança pelos Investimentos e Negócios de Impacto, lançado durante o Fórum de Finanças Sociais deste ano.

Segundo o manual, ainda que uma companhia não se adeque enquanto negócio de impacto, ela poderia apoiar o ecossistema por meio de compras, por exemplo. Mas também por participações, doando ou emprestando e oferecendo garantias. Para além de recursos financeiros, garantir acesso à infraestrutura, metodologias, inteligência ou, até mesmo, a sua rede de clientes pode ser fundamental.

Caminho curto?

Embora essa discussão esteja sendo conduzida com proeminência, o movimento das empresas é “paquidérmico”, segundo Comini. Ainda não se multiplicam os casos de grandes empresas que trazem teses de impacto para seus modelos de negócio.

Todavia, ainda que lento, há movimento. Praticamente, em uma lógica  de fora para dentro, são as Fundações e Institutos vinculados a essas empresas que têm puxado o tema para o centro das decisões. Elas próprias têm testados algumas soluções neste sentido.

Impacto na cadeia de valor

Um dos exemplos disso está ocorrendo dentro da InterCement. Ligada ao Grupo Camargo Corrêa, a InterCement é vice-líder no mercado brasileiro de cimento. Atualmente representada pela diretora executiva Carla Duprat, a agenda de seu instituto tem levado a empresa a experimentar com  negócios de impacto. Com isso, algumas preocupações socioambientais passam a ser incluídas com mais ênfase na sua cadeia de valor.

Em 2011, a indústria de cimento respondia por 7% de emissões globais de CO2 no mundo. Segundo o Batelle Memorial Institute, o cimento emitirá, em 2050, 5 bilhões de toneladas de dióxido de carbono na atmosfera, devido ao aumento populacional e aumento da demanda da construção civil.

Segundo seu relatório de performance ambiental, a InterCement emitiu globalmente 13 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera em 2017. É a mesma quantidade de 2016. Em 2015, foram 15 milhões.

Do ponto de vista social, uma fábrica de cimento é um colosso instalado em cidades pequenas e geralmente não emprega muita gente. Um estudo da Universidade de Brasília, de 2008, relata que a chegada da fábrica Ciplan em Queima Lençol (DF) ofereceu trabalho para apenas 19 pessoas diretamente e 28 indiretamente.

Segundo o vice-presidente de negócios da InterCement, André Schaeffer, a discussões sobre os impactos negativos que a indústria gera vem ocorrendo, internamente, há 10 anos.

“A maioria das empresas começaram a agir pela inviabilidade econômica de continuar causando impacto ambiental”, comenta André. “No nosso caso, o catalisador foram as pessoas mesmo. O movimento começa por ter alguém na empresa que chame a atenção para pensarmos no nosso impacto socioambiental. Aqui, a Carla [Duprat] tem um papel fundamental nisso.”

A fala de André demonstra o papel do Instituto em trazer para o centro da discussão o objetivo do impacto socioambiental positivo. Na InterCement, segundo o vice-presidente, tem-se identificado há oportunidades de avanços nas cadeias de produção. Exemplos práticos: o fomento na produção local de alimentos e uniformes que abastecem suas fábricas ou o uso de combustíveis alternativos na queima do cimento.

Os negócios de impacto, porém, têm se oferecido como ferramentas para lidar com alguns desses problemas. A InterCement vem experimentando com esses modelos. Desde 2015, mais notoriamente, é fornecedora de cimento do Programa Vivenda. Em 2017, a companhia deu início a um estudo sobre o desperdício de materiais no projeto, com objetivo de melhorar a eficiência e testar tecnologias.

Também em 2017, a InterCement compôs junto ao grupo Fundações e Institutos de Impacto (FIIMP) iniciativas de empréstimos e participações em negócios de impacto. A companhia desenvolveu junto à Din4mo Ventures e outros cinco institutos a experiência de equity crowdfunding que atraiu R$ 1,7 milhão às startups +60 saúde e ao programa Vivenda.

Em 2018, durante o Fórum de Finanças Sociais, a InterCement anunciou a iniciativa Housingpact. André comenta que o programa está ainda embrionário e, portanto, não pode ser avaliado. Mas em linhas gerais, é um convite para outros atores da construção civil para fomentar soluções de moradia e sustentabilidade junto às startups de impacto. Fazem parte da ação também BASF, Duratex, Neogera, Impact Hub e Fundação Espaço Eco.

“O olhar da empresa muda quando vier um impacto econômico neste assunto. E, por isso, a InterCement está trazendo a questão do impacto um pouco para o core business da empresa”, comenta André. Uma forma é gastar 100 milhões de dólares num projeto ambiental que não tem retorno econômico. Outra é gastar 200 milhões de dólares num projeto que gera impacto socioambiental positivo com um retorno de 300 milhões. Para esse eu nem preciso perguntar [por permissão].”

A iniciativa demonstra na InterCement a intenção de trazer negócios de impacto para a cadeia. “O que a gente quer com esse projeto [o Housingpact] é juntar empresas do setor de construção com mentalidade de investimento ambiental e social como a nossa. O objetivo é escalar essas soluções”, revela André.

Na próxima reportagem, detalharemos como se deu a experiência com negócios de impacto na Fundação Boticário. Por lá, o case é o projeto Araucária+.

Impact Hub São Paulo cria dicionário para o setor de impacto

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A complexidade de alguns termos utilizados dentro do terceiro setor pode criar uma sensação de distanciamento com o campo de impacto, como conta Dj Bola em entrevista para a Aupa. Em uma tentativa de diminuir essa ponte e democratizar o conhecimento no setor, o Impact Hub São Paulo criou um dicionário com conceitos e palavras muito presentes na fala de atores do campo. O arquivo pode ser baixado por qualquer pessoa acessando este link.

Durante a produção do dicionário, a Impact Hub São Paulo consultou nomes experientes da área de impacto, como Célia Cruz (Instituto de Cidadania Empresarial-ICE) e Daniel Izzo (Vox Capital).

 

Inscrições para Lab Habitação: Inovação e Moradia estão abertas

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O programa de aceleração a curto prazo realizado pela Artemisia e Gerdau receberá inscrições gratuitas até o dia 24 de setembro. As 15 empresas selecionadas para o Lab Habitação: Inovação e Moradia, participarão de um programa de aceleração por seis semanas. O programa conta, inclusive, com workshops presenciais e webinares com “foco no refinamento do modelo de negócio e no impacto social das soluções”.

A seleção

Serão selecionadas 15 “startups inovadoras que atuem no setor de habitação e com potencial para impactar positivamente as condições de moradia de milhares de brasileiros e brasileiras”. Para a seleção é preciso que as empresas estejam familiarizadas e alinhadas com os temas do acesso a moradias, empregabilidade na construção civil, reformas habitacionais, microcrédito habitacional e inovação na construção civil.

Com o apoio do Instituto Vedacit, Grupo Tigre e Eternit, o programa é realizado pela Artemisia e Gerdau. Entre os objetivos está o fortalecimento das soluções de impacto que podem ajudar a tornar dignas e confortáveis as moradias de milhares de brasileiros mais salubres.

 

Graziella Comini: “Não consigo ver uma sociedade que busque desenvolvimento sustentável sem a atuação do Estado”

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Há um movimento evidente de pesquisas acadêmicas voltadas à temática de negócios de impacto social. Isso se expressa no boom, dos últimos cinco anos, na oferta de cursos e de núcleos de estudo dedicados a este formato organizacional.

Mas seria um equívoco dizer que trata-se de um interesse inédito. E a professora Graziella Comini é prova viva de que, já há tempos, as universidades são motores da reflexão sobre as dinâmicas de mercado e de suas possíveis transformações. “O termo ‘negócios de impacto’ pegou e vem entrando no mainstream para discutir assuntos que são objetos de pesquisa há algumas décadas”, comenta Comini.

Economista com livre-docência em administração pela Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), Comini se especializou em empreendedorismo social e terceiro setor. É ela quem coordena o Centro de pesquisa dedicado a estes temas na USP, o CEATS, além de ser coordenadora do MBA em Negócios Socioambientais do Insituto Ipê.

Sua proximidade com esta temática começou durante seu mestrado, nos anos 1990. Na época, o Brasil discutia a regulamentação das ONGs. Ao mesmo tempo, pensadores do calibre de Milton Santos e Paul Singer debatiam conceitualmente formas de economia solidárias. Para Comini, a discussão sobre negócios de impacto hoje é herdeira desses temas, com os quais ela se dedica desde o princípio. Por isso mesmo, se tornou uma das principais referências no Brasil sobre o tema.

Em conversa com a Aupa, Comini comenta sobre o boom de pesquisa em negócios de impacto nas universidades. Mas também dividiu o que pensa sobre os principais desafios do ecossistema. “Enquanto pesquisadores, sempre temos que ter um olhar critico no sentido de mostrar as incongruências, as dissonâncias, os erros, as falhas ou os alertas. Sempre no intuito de construir juntos”, opina

Gostaria que todos os empreendimentos privados com lógica de mercado fossem negócios de impacto no futuro. Assim, quem sabe, minhas netas e bisnetas não precisarão fazer a diferença.

AUPA | Há um esforço no ecossistema em tornar as discussões sobre o negócios de impacto cada vez mais assuntos nas universidades, em suas várias disciplinas e campos de conhecimento. Pela sua trajetória, você percebe evolução nessas aproximações?

GRAZIELLA COMINI | É super interessante sua pergunta porque, de fato, é um tema que tenho trabalhado praticamente desde a década de 90. Eu tive o privilégio de estar na universidade no momento em que se discutia no Brasil a formalização das organizações da sociedade civil (OSCIP). Foi todo um trabalho no governo do Fernando Henrique Cardoso com a professora Ruth Cardoso que estava pautando a questão das alianças intersetoriais. Havia um reconhecimento de que o Estado não tinha braço suficiente pra dar conta dos problemas socio-ambientais. Isso não significa que o Estado não seja importante. Pelo contrário, é fundamental. Mas outros tipos de atores deveriam contribuir efetivamente pra um desenvolvimento sustentável.

A partir de então, as empresas também começaram a acentuar trabalhos de responsabilidade social corporativa que depois evolui pra discussões de sustentabilidade. Enfim, eu tive a oportunidade de acompanhar o embrião do debate que viria a ser sobre os negócios de impacto. Um debate que cada vez mais vai dando  sentido uma nova geração que quer dar um legado nessa sociedade, contribuir pra minimizar os problemas estruturais socio-ambientais. Para esta nova galera, a questão de poder gerar lucro e, ao mesmo tempo, gerar valor socio-ambiental, soa muito interessante. Por isso mesmo, percebe-se um interesse dos jovens que vai cutucando os seus docentes e criando um movimento nas universidades que eu diria que começa muito de baixo para cima.

A universidade vai, então, pesquisando sobre este fenômeno e introduzindo essa temática em diversas disciplinas. No início, a gente começou discutindo a responsabilidade social corporativa. Hoje, o que é diferente é o estudo de um formato organizacional híbrido, agregando duas dimensões que eram associadas por atores diferentes. Em suma, gerar resultado econômico era a meta das empresas tradicionais, gerar resultado socio-ambiental era a meta de organizações sem fins lucrativos. Juntar esses dois em um mesmo espaço cria uma organização hibrida que começa a ser estudada por diferentes docentes e pesquisadores. Isso introduz novos assuntos de pesquisa em diversos campos do conhecimento. Por exemplo, quais são as estratégias de marketing para esse formato? Como é a captação de recursos? Quais são as novas soluções ambientais que a engenharia florestal irá produzir? Na medicina, na educação… E principalmente no campo da gestão.

Há um interesse dos jovens [por negócios de impacto] que vai cutucando os seus docentes e criando um movimento nas universidades que eu diria que começa muito de baixo para cima.

AUPA | Entrando nas questões conceituais, alguns artigos seus tratam sobre como a definição de negócio de impacto está sendo desenvolvida ao redor do mundo. É interessante obseravar quanto que a questão da cultura local influencia nessa conceituação. Com sua pesquisa, o que dá pra destacar como próprio na conceituação brasileira de negócios de impacto? 

GRAZIELLA COMINI | É preciso dar passinho atrás antes de falar do Brasil. Se nós estivéssemos de fato em um mundo onde tudo tivesse funcionando, talvez não fosse preciso ter negócios de impacto. Esse conceito vai surgir por questões de falhas do mercado, falhas de atuação do mercado que acabaram gerando desigualdades. Nós sabemos que o capitalismo, do jeito que foi depois da revolução industrial, gera bastante inovações, mas não consegue trazer juntamente igualdade socio-ambiental. Ao mesmo tempo, observa-se sociedades que foram apostando no papel do Estado na solução destas assimetrias. Em economias como a dos Estados Unidos, o papel do estado é de não interferência. Já nas economias europeias, há o well fair state [Estado de Bem Estar Social] já mais interferente. O caso do Brasil é muito curioso porque, aqui, nós gostaríamos que o Estado atuasse efetivamente na busca de soluções, mas ele não consegue dar conta de problemas  estruturais. Então começamos a ter vazios, literalmente de situações crônicas para as quais a sociedade civil começa se sentir responsável.

Na europa, o Estado funciona e a sociedade tem uma preocupação efetiva de que os governos deem ressonância aos desejos da comunidade. Há, portanto, uma ênfase em governâncias mais coletivas. Nos EUA, foca-se muito mais nas potências individuais, o lado empreendedor e a participação da comunidade nas decisões não é um ponto fundamental. No caso do Brasil, temos uma Constituição que mira por um Estado como os europeus, mas os nossos negócios são muito influenciados pelo jeitão norte-americano. Alias, a origem dos cursos de administração do Brasil vem de uma missão estado-unidense. Também por isso os negócios de impacto brasileiros tendem a ter uma ênfase empreendedora e atuam nos vazios institucionais onde o Estado não dá conta. Quando vou em congressos na Europa costumo ouvir exemplo de creches como negócios sociais. Eu ouvia e pensava: nossa, creche? Eu nunca associei creche a um negocio social, entendeu?

Eu não sei se há um jeito brasileiro de fazer negócios de impacto, mas eu sei que a gente esta tentando contribuir e cada vez mais tem sido mais efetivo. Os empreendimentos que procuram aliviar o Estado  acabam sendo mais lucrativos quando eles buscam uma população que seria uma classe C que esta em uma condição entre poder ter um plano de saúde particular, mas que também deveria ter um bom serviço público. Então, por aqui, os negócios de impacto vão trabalhar em aliviar para o Estado, tirar a pressão de um atendimento gratuito pra uma população , algo que não se vê nos Estados Unidos. Por isso mesmo, a atuação aqui no Brasil tem se diferenciado da atuação em outros países.

No Brasil, OBSERVAMOS os negócios de impacto trabalhando em aliviar para o Estado, tirar a pressão de um atendimento gratuito pra uma população. Algo que não se vê nos Estados Unidos.

AUPA | Estamos vivendo uma época de paranoia ideológica em relação ao papel do Estado. Caímos em uma polarização difícil de sair entre Estado mínimo e Estado máximo. Qual é o seu olhar sobre as possíveis funções do Estado brasileiro em relação à potencialidade dos negócios de impacto?

GRAZIELLA COMINI | A própria Constituição de 1988 deixou evidente a necessidade da descentralização. Antes dela, tínhamos investimentos  concentrados em nível federal e, depois dela, foi determinado que a execução de investimentos faz mais sentido no nível dos municípios. Considerando este princípio, eu considero os atores lá na ponta  entendem as necessidades daquela realidade e  podem agregar valor à atuação pública. O Estado, portanto, poderia fazer parcerias e convênios não apenas com organizações da sociedade civil. É preciso considerar e não excluir. Eu sou muito da inclusão amplo senso.

Não acho que o melhor formato organizacional sejam os negócios de impacto. Eu levanto a bandeira dos negócios de impacto como mais um formato interessante. Gostaria que todos os empreendimentos privados com lógica de mercado fossem negócios de impacto no futuro, para a intenção de gerar valor socio-ambiental. Assim, quem sabe, minhas netas e bisnetas não precisarão fazer a diferença. Hoje, é preciso uma diferença porque as empresas nascem para gerar valor para seus acionistas. Com os negócios sócio-ambientais a gente parte de uma nova lógica. No meio tempo, a gente vai ter que conviver com a ideia de trocar os pneus com o carro andando. Isso vai dando uma sensação de desespero para alguns. Mas como eu não sou de uma geração muito ansiosa, eu vejo a perspectiva de maneira muito positiva.

Nessa transição, a relação com o estado é necessária. Não consigo ver uma sociedade que vá buscar um desenvolvimento sustentável sem uma atuação importante do Estado. É ele quem é capaz de identificar onde há falhas no mercado para cobrir uma população mais vulnerável e que normalmente, pela logica de mercado, não seria atendida. Sou contra um estado total, que não reconheça a importância e a potência dos empreendimentos privados, mas eu não sou daquelas que acreditam no Estado minimo. Eu vejo a possibilidade de políticas públicas que incluam uma massa de população por meio do reconhecimento de empreendimentos inovadores que poderiam executar essas politicas e trazer alguns novos instrumentos para isso.

Sou contra um estado total, que não reconheça a importância e a potência dos empreendimentos privados, mas eu não sou daquelas que acreditam no Estado minimo.

AUPA | Você mencionou outro ponto crucial que é o papel das grandes corporações no ecossistema de impacto…

GRAZIELLA COMINI | No próprio Fórum de Finanças Sociais saiu uma cartilha produzida pelo Sense-Lab discutindo as diferentes maneiras por meio das quais uma grande corporação contribuiria para o fomento de negócios de impacto. Não acredito, sinceramente, que elas possam se tornar, elas próprias, negócios de impacto. Mas elas poderiam incluí-los na sua cadeia de valor, estimulando inovações. Elas têm um papel muito mais de fomento, portanto. Com isso temos alguns movimentos do capitalismo consciente, do Sistema B, que buscam modificar práticas de gestão para que as corporações sejam menos exclusivas. Para empresas, é importante pensar em contratar fornecedores locais para estimular inovações que as grandes não conseguem criar, justamente por serem grandes. São elefantes grandes que se movimenta lentamente. Assim, é possível resolver alguns problemas que as empresas têm na sua cadeia, como reciclagem,por exemplo. Há soluções para essas questões em negócios de impacto, que podem ser contratados.

AUPA | As empresas como clientes, então…

GRAZIELLA COMINI | E como incubadoras. Para alguns desafios, funciona realizar chamadas para que negócios de impacto possam buscar essas alternativas.

O ponto que a gente tem que se perguntar é: para os negócios de impacto efetivamente se consolidarem, o quanto vão abrir mão da geração de valor socio-ambiental para serem mais lucrativos?

AUPA | Isso tangencia o debate sobre como negócios de impacto podem se tornar escaláveis. Nos Estados Unidos, a escala é mais cobrada. Na Europa, nem tanto. E aqui mais uma vez a gente está no meio do caminho. Escala é uma preocupação, mas ao mesmo tempo nos perguntamos que tipo de crescimento é esse e como medimos melhor o sucesso desses negócios. O que você pensa sobre a questão?

GRAZIELLA COMINI | Há diferentes tipos de escala. A gente sempre associa a escala com um número maior de beneficiários e clientes, enquanto uma escala quantitativa. Mas há a escala scale up, que é medir o impacto de um negócios em políticas publicas. Quando uma iniciativa se torna política pública, é tiro de canhão. Enquanto se é um negócio de impacto, seu tiro é de andorinha, pequeno. Quando entra em uma oferta pública, há maior propensão de mudar uma situação. Quando a gente fala em scale deep, há maior diversificação na maneira de mensurar mudanças comportamentais. Então não há um modo de pensar nisso. O que ocorre é que há da parte de quem esta financiando um olhar para métricas quantitativas que medirão o sucesso dos negócios. Por isso a gente batalha para ter outros tipos de financiadores que acreditem em outros modos de medir esse sucesso.

Explorei muito as noções de tipos de inovação na minha tese de livre-docência. Vi que havia dois cenários muito interessantes e não excludentes. Há empreendimentos que geram inovação facilmente escalável quantitativamente. Esses são como um mergulho superficial no oceano. Há também inovações que têm como finalidade transformar determinadas realidades com mais profundidade, como se fizesse um mergulho com oxigênio e fosse lá no fundo do mar entender melhor as origens de um problema. Portanto, esses empreendimentos têm uma contribuição mais qualitativa.

Esses dois tipos de negócios deveriam ser foco dos financiadores. Há um risco de só acreditar naquele que esta escalando, mas cuida de um sintoma. Há dois tipos de rentabilidade. Uma é aquela consegue ter rapidamente uma geração de valores econômico mais rápido. A segundo, embora não perca dinheiro, têm uma rentabilidade econômica menor, mas com grande geração do valor socioambiental. Fundações empresariais que não tem essa gana pela geração de valor econômico poderiam apostar mais em empreendimentos com contribuições mais profundas para determinadas causas. Já fundos de investimento de impacto, pela sua própria dinâmica, apostam em negócios escaláveis.

AUPA | A pesquisa acadêmica pressupõe um posicionamento crítico diante de um fenômeno para entendê-lo em suas várias facetas. A pesquisa universitária consegue estudar esse fenômeno fugindo de um tom celebratório sobre ele?

GRAZIELLA COMINI | Você tem razão. Enquanto pesquisadores, sempre temos que ter um olhar critico, mas não destrutivo. A crítica deve ser no sentido de mostrar as incongruências, as dissonâncias, os erros, as falhas ou os alertas. No intuito de construir o ecossistema. Neste sentido, nosso atual problema de pesquisa é, para os negócios de impacto efetivamente se consolidarem, o quanto vão abrir mão da geração de valor socio-ambiental para serem mais lucrativos? Isso ainda é uma pergunta em aberto porque os empreendimentos brasileiros ainda estão em fase de consolidação. Na dinâmica brasileira, muitos dos empreendimentos estão se abrindo para fundos de investimento de impacto. Estamos vendo os primeiros IPO’s, as primeiras aberturas. Uma coisa são os fundos de impacto que você sabe da intenção, do propósito. Mas, quando se vende a parte desses fundos, quem serão esses novos sócios, como sera esse funcionamento e dinâmica? Quais cuidados teremos de governança para manter o propósito inicial diante do avanço das ofertas da capital? São perguntas ainda em aberto.

 

Novos instrumentos em finanças sociais chegam aos negócios de impacto

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Em 2015, um grupo de diversos atores começou a se reunir para estudar e analisar as demandas, desafios e oportunidades do ecossistema de Investimento de Impacto no Brasil.  A iniciativa que ficou conhecida como Força Tarefa de Finanças Sociais. Recentemente, seu nome foi alterado para Aliança pelos Investimentos e Negócios de ImpactoEntre seus vários desafios, a ampliação da oferta de capital se mostrou como parte fundamental da engrenagem para fortalecer o campo.

Algumas respostas para este desafio vem surgindo. Algumas no sentido de idealizar e testar rapidamente modelos inovadores que possam atrair, principalmente, o capital tradicional privado para o campo de negócios de impacto.

Talvez o caso recente mais emblemático no Brasil seja a debênture do bem, criada no início deste ano, pela securitizadora Gaia, em parceria com a consultoria Din4amo. Este novo mecanismo financeiro beneficia, atualmente, o Vivenda, programa de reformas habitacionais de baixo custo.

Além de combinar fundos filantrópicos com investidores tradicionais, a grande inovação desse modelo está no potencial criado a partir no novo mecanismo. Ao final de 10 anos, estima-se que o investimento inicial será multiplicado por oito. Isso significa beneficiar muito mais gente com as reformas de casas. Esse modelo de emissão de títulos dá fôlego e confiança aos negócios de impacto mais estruturados e pode se revelar uma maneira eficiente de escalar iniciativas e atrair mais investidores tradicionais.

Outros modelos financeiros também estão sendo testados por um grupo de fundações e institutos de impacto. Inspirados pela Aliança pelos Investimentos e Negócios de Impacto, o FIIMP reúne, desde 2017, 22 organizações com o objetivo de experimentar e aprender com novas formas de investir em negócios de impacto.  Juntas, as fundações e institutos aportaram um total de R$ 703,5 mil para testar três instrumentos financeiros diferentes, por meio de três instituições intermediárias.

Um dos mecanismos em teste é a Garantia de Empréstimo. Na prática, o FIIMP, como investidor, aportou R$ 167,5 mil na SITAWI Finanças do Bem, uma OSCIP gestora de fundos socioambientais. A Sitawi, por sua vez, assumiu o papel de avalista ou fiador para o empréstimo a ser contratado por um negócio de impacto.

Com o contrato de garantia em mãos, a ideia central é possibilitar às empresas sociais nascentes ou em crescimento o acesso a fontes de capital, como linhas de crédito em bancos comerciais tradicionais.

A experiência no âmbito do FIIMP, no entanto, ainda não se concretizou. Um dos desafios a serem vencidos é o prazo de negociação na escolha do negócio de impacto, que nesse teste levou nove meses e fez com que o empreendedor selecionado desistisse. A expectativa é que um outro negócio possa acessar a garantia até o fim de 2018.  

O Título de Dívida Conversível foi outro instrumento testado pelo FIIMP. Nesse caso, cinco institutos colocaram R$ 167,5 mil em um sindicato (grupo de investidores) liderado pela Din4mo Ventures, que passou a gerir o capital via plataforma de Equity Crowdfunding, o Broota (hoje com novo nome: Kria). O mecanismo permite ao gestor, no caso a Din4mo, captar de outras fontes via plataforma, ampliando o capital que chega aos negócios sociais a serem investidos.

A terceira experiência do grupo foi com a ferramenta de Dívida. Outros R$ 167,5 mil foram investidos no Fundo Bemtevi que faz empréstimos para negócios sociais. Nesse modelo, 50% do valor foi destinado às empresas e a outra parte foi para uma aplicação financeira. O rendimento dessa aplicação fica com a Bemtevi que retorna o principal aos investidores em quatro anos. No formato de empréstimo, o percentual do atingimento do impacto pelos negócios é fator de redução de juros do empréstimo.

Minha breve avaliação:

  1. É um primeiro passo positivo na diversificação de instrumentos para atender a diferentes demandas de negócios de impacto em diferentes estágios de maturidade;    
  2. A experiência de atrair investidores tradicionais colocando na frente o capital filantrópico pode ampliar (e em muito) a capacidade de impacto das iniciativas, ainda que os valores sejam muito tímidos nesse começo;
  3. É importante que todas essas experiências sejam acompanhadas e os aprendizados, ao longo do curso dos investimentos, sejam amplamente compartilhados. O engajamento de outras fundações e institutos pode expandir e fortalecer esse movimento.

Vamos ficar de olho!

Com cursos sobre negócios de impacto, universidades se aproximam e fomentam o ecossistema

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Nos últimos cinco anos, ergueram-se algumas pontes entre o ecossistema e a pesquisa acadêmica. Os indícios disso aparecem na criação de novos cursos sobre negócios de impacto social nas mais variadas universidades brasileiras, além do apoio para pesquisas e para estudos de caso.

Desempenhando um papel fundamental na orquestração do cenário acadêmico está o Instituto de Cidadania Empresarial (ICE), um dos articuladores quando o tema é negócio de impacto. Em 2013, o instituto começou a rodar o Programa Academia, o qual visava fortalecer a produção de conhecimento e aumentar a atuação das Instituições de Ensino Superior brasileiras.

“O Programa Academia nasceu assim que o ICE assumiu a temática dos negócios de impacto. Nosso objetivo era de aproximar a universidade deste universo tanto para ajudar na conceituação do campo no Brasil, quanto para começar a estimular as pesquisas, aulas, atividades de extensão”, conta Adriana Mariano, gestora do Programa Academia. “O tempo inteiro, a gente tenta quebrar esta barreira da academia. Queremos que ela seja cada vez mais um ator dentro do ecossistema”, completa.

Formando a rede

Nos dois primeiros anos, a iniciativa limitou-se a formar uma rede de professores do Sudeste do país. Reuniu, a principio, representantes da FGV-SP, FEA-USP, Insper, ESPM, SENAC, Unicamp, FEI, EACH – USP, FGV-RJ e St. Gallen – SP. Esta primeira etapa contou com recursos do Fundo Latino Americano de Inovações em Economia de Impacto, da Fundação Telefônica Vivo e do Instituto Quintessa, que possibilitou a criação de editais internos para incentivar a produção dentro das universidades.

O estímulo desta primeira etapa gerou a produção de dois artigos, quatro pesquisas, onze estudos de caso e três competições. Também ajudou na institucionalização de dois grupos: o Núcleo de Medição para Investimentos de Impacto Socioambiental, do Insper, e o Núcleo de Negócios de Impacto Social, no âmbito do Centro de Empreendedorismo em Novos Negócios, da EAESP-FGV. A partir disso, os núcleos também têm sido propulsores da criação de disciplinas, como Empreendedorismo Social, no curso de graduação da EAESP-FGV.

Além disso, uma das estratégias definidas pela rede do Programa Academia foi a criação do Prêmio Academia ICE que chega, em 2018, a sua 5ª edição, oferecendo prêmios em dinheiro para trabalhos de graduação, mestrado e doutorado. “O prêmio tem crescido anualmente. A última edição teve aproximadamente cinquenta inscritos, mas o primeiro ano começou com onze. E, cada vez mais, os trabalhos vêm sendo mais específicos”, revela Adriana.

Em 2014, um novo apoiador entrou neste cenário, o gigante banco de investimentos J. P Morgan. Resultado disso: no ano seguinte o programa ampliou sua extensão, gerando mais investimento, desta vez por parte do Laboratório de Inovação do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o FOMIN. Hoje, o programa conta com 75 professores membros de todo o país que participam de learning sessions, webinars, trocam metodologias de ensino e estudos de caso, além de participarem de congressos nacionais e internacionais. A última edição do Fórum de Finanças Sociais, para se ter uma ideia, teve cinquenta professores inscritos.

Ilustração: Fernanda Sanovicz.

“Acho que a principal forma de atuação da Academia é a interlocução. O professor fica muito sozinho em sala de aula com o aluno. A gente corre atrás de referências na internet, nos livros para tentar se atualizar, mas como é um tema muito novo, precisamos de interlocução entre os próprios professores e os setores”, conta Ruth Soriano, economista, professora do domínio adicional de Empreendedorismo há seis anos e, desde 2016, é coordenadora dos projetos de Negócio de Impacto da PUC-RJ. Disponível para os graduandos e com duração de um ano e meio, o curso aborda todo o espectro que envolve a criação de um negócio e dá a possibilidade do aluno encerrar sua passagem pela faculdade com um diploma adicional de uma certificação minor.

Expansão na oferta de cursos

Fruto desse esforço, foram publicadas quinze ementas de cursos nas seguintes universidades: UFRGS, UESC, SIT, Unicamp, Insper, PUC-RJ, Unisinos, UNA, UFMS, UDF, FGV, FEI e FEA. Apesar de ser o principal agente estourando a “espessa bolha acadêmica”, alguns cursos de negócios de impacto encontraram outras formas de dar seus primeiros passos. Um dos primeiros cursos a tratar o tema na universidade brasileira foi o da ESPM, criado em 2013 em parceria com o Yunus Business Centre. O curso de 120 horas e 10 semanas, expandiu-se rapidamente para a unidade carioca da ESPM, onde Rodrigo Carvalho é o coordenador.

Com sua quarta turma recém-formada, o curso já ajudou a encaminhar trinta e três projetos e costuma aglutinar três principais tipos de perfis de alunos. “Há as pessoas que estão em transição de carreira, pessoas oriundas do terceiro setor e quem está dentro de grandes organizações que estão próximas ao universo da responsabilidade social”, revela Rodrigo.

Ao longo do tempo, as motivações que levaram essas pessoas a se matricularem foram mudando e a questão do empreendedorismo como propósito ganhou mais espaço. “Claramente, do ano passado para cá, há uma maior tendência das pessoas quererem desenvolver seus próprios projetos como instrumento de transformação das suas próprias vidas. Isso sempre houve, mas nas duas últimas turmas este número aumentou 100%”.

“Não sou uma pessoa do meio do empreendedorismo social, mas é um futuro que não tem jeito de não acontecer. Por isso, comecei a buscar alguns cursos neste sentido” —  Rachel milech

Não é só no Brasil…

Esta crescente onda de novos cursos sobre o tema é global. Universidades tradicionais norte-americanas como a Harvard e a Stanford oferecem cursos de pequena duração para executivos. Na primeira, o curso aplicado leva o título de Creating Shared Value: Competitive Advantage through Social Impact, o qual este ano acontecerá de 3 a 5 de dezembro. O valor da inscrição é de 6.500 dólares. Já a segunda universidade disponibiliza o curso Executive Program in Social Entrepreneurship, com duração de uma semana e custa cerca de 4.750 dólares.

Um exemplo desse movimento é a consultora Rachel Milech, que decidiu estudar o assunto fora do país. Entretanto, escolheu pela Universidade da Pensilvânia nos Estados Unidos para aprimorar seus conhecimentos. Ela uma dentre os três brasileiros cursando a cadeira Executive Program for Social Impact Strategy, com duração de oito meses na universidade americana. O curso existe desde 2015, sendo uma parte cursada presencialmente e outra à distância. Vale informar que quem faz o curso fica com créditos, caso queira fazer o curso de mestrado oferecido pela própria universidade.

“Não sou uma pessoa do meio do empreendedorismo social, mas é um futuro que não tem jeito de não acontecer. Por isso, comecei a buscar alguns cursos neste sentido”, comenta Rachel. “Pesquisando, achei que, num curso fora do país, eu teria acesso a pessoas de vários países e acabei escolhendo um com um bom programa e custo-benefício”.

Para quem não tem certeza de que está disposto investir cerca de 5.450 dólares, em média, numa inscrição dessas universidades, é possível experimentar uma versão gratuita do curso. O site Cousera oferece uma versão reduzida de quatro semanas, com carga-horária de 16 horas de estudo.

O espírito coletivo e seus ganhos

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Ultimamente eu venho vivenciando um movimento muito interessante que é a convocação de pessoas em prol de um bem comum. O renascer do espírito coletivo. No trabalho, cada vez mais, empresas e organizações nos procuram para ajudar a articular conversas em rede. Com os meus amigos, faço campanhas de financiamento coletivo para beneficiar alguém. Durante o final de semana, participei de um mutirão para construir uma área de lazer na comunidade dos Pilões, em Cubatão. No aniversário na casa do colega, cada um tinha que levar sua bebida e um prato.

Enfim, a sociedade está se organizando de uma maneira mais colaborativa para alcançar o objetivo desejado. Algo que, na verdade, não é nenhuma novidade. Antigamente, lá no passado, os nossos ancestrais se organizavam em tribos, por exemplo. E, extrapolando o tema para o mundo animal, o que dizer das manadas, colmeias e bandos? Todo mundo trabalhando e/ou vivendo em comunidade para, juntos, alcançarem algo bom para todos.

Eu estou comentando tudo isso só para refletir sobre algo que tem se falado muito, que é o poder da colaboração e das redes. Quando eu vejo que uma praça é construída porque centenas de pessoas se mobilizaram para fazer acontecer, isso me encanta. Que uma arrecadação financeira dá certo porque diversas pessoas foram acionadas, se sensibilizaram e contribuíram, isso só reforça o meu acreditar que o ser-humano é muito bom. A festa em casa acontece sem pesar no bolso do anfitrião porque todos contribuem com os comes e bebes. Resultados efetivos se concretizam porque as pessoas passam a cocriar juntas em uma reunião.

Tudo isso me faz refletir sobre o quanto nós somos capazes. É aquele tal negócio: sozinho, é muito mais difícil. Vieram os coworkings, agora os cohousing e, cada vez mais, movimentos surgem para nos mostrar que juntos, podemos mais. As próprias empresas estão ampliando o olhar e, algumas, já estão adaptando suas estruturas para um modelo mais decentralizado e que permita uma gestão mais participativa. E isso não é só uma bela onda que vai passar.

Cada vez mais as pessoas estão se reconectando e conectando, não é uma tendência, é fato que nós estamos entendendo que o fazer junto gera muito mais resultado – financeiro e, principalmente, para a saúde mental e espiritual. E quem lucra com tudo isso? Nós, a sociedade e o meio-ambiente. Quando entendemos que tudo é de todos e fazemos parte do todo, cuidamos para ter sempre. E eu fico feliz por poder experimentar tudo isso.

 

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