A crise climática é uma expressão bastante recorrente no debate público, uma vez que trata das mudanças que afetam o clima e as variações de temperatura, precipitação e nebulosidade em escala global. Tudo isso considerando também a interferência do homem. Segundo o relatório Mudanças Climáticas: Consequências Desastrosas, da WWF, os seres humanos são os responsáveis pela alta das concentrações atmosféricas de dióxido de carbono (CO2) e outros gases de efeito estufa, por exemplo.

Ainda segundo o relatório, para o Brasil manter o aquecimento global médio abaixo de 2º C, será preciso conter o desmatamento com metas de queda, além de manter a matriz energética limpa.

Partindo deste contexto, Graziella Comini, economista e docente da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP), explica o termo “greenwashing” e como é possível identificar uma empresa geradora de impacto socioambiental. Confira a entrevista completa.

Aupa   É possível afirmar que grandes empresas são sustentáveis? 
Graziella Comini – Isso depende muito e temos visto alguns movimentos em certos setores que vão introduzindo determinados padrões. Por exemplo, o setor de mineração, depois de todas as tragédias, foi implementando alguns tipos de padrões em suas operações, de modo que estes processos são melhores do que há 10 anos atrás, obviamente – afinal, a própria regulação também contribui para isso. Temos um movimento que é importante, no sentido de que algumas grandes empresas na liderança podem influenciar as demais.

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Aupa – Quais são os critérios para uma empresa ser ambientalmente correta?
Graziella Comini – As ações devem ser transparentes, estar no modelo de negócio e no cotidiano da empresa. A organização mostra as ações na forma de conduzir as relações entre os vários atores da cadeia de valores, tanto o fornecedor quanto o consumidor deve perceber que estas ações estão inseridas no produto. Isso muda quando se trata de uma empresa B2B (business-to-business) e B2C (business-to-consumer). Desse modo, o mais importante é a transparência que grandes corporações tenham e deixem evidente o modelo de negócio, quais são as inovações e o quanto essas inovações estão vinculadas. A partir destas ações é possível ter alguns elementos para avaliar a coerência.

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Aupa – Considerando a Agenda 2030 da ONU e também a Floresta Amazônica enquanto pauta econômica mundial no debate público, como podemos relacionar estas temáticas aos negócios de impacto?
Graziella Comini – A Amazônia é um território fundamental para o mundo.  Por este motivo, precisamos batalhar para que haja o uso do território para as comunidades que vivem lá e que são responsáveis por manter a floresta em pé. Trata-se de um cenário de pobreza, de modo que há iniciativas criadas por famílias e que estimulam projetos, sendo alternativas de geração de renda para a população que vive lá. A Amazônia tem a maior biodiversidade possível de ser encontrada por metro quadrado. Com consciência, dá para fazer diversos projetos na região. É o nosso tesouro e pode gerar qualidade de vida para as pessoas que vivem lá, além de acabar com a pobreza e ter um equilíbrio ambiental. 

Aupa – O que é greenwashing e como funciona dentro das empresas?
Graziella Comini – O greenwashing ou “banho verde” indica a apropriação de virtudes ambientalistas por parte de organizações. Consiste na prática de promover discursos, anúncios, propagandas e campanhas com características ecológica e ambientalmente responsáveis e sustentáveis. Significa que a empresa está maximizando uma determinada ação que ela fez e não corresponde às mudanças de processo produtivo. Ou seja, a empresa finge que  é compromissada com o meio ambiente, com monitoramento externo que comunica que ela está fazendo algo para a conservação do meio ambiente, porém, na prática, a empresa não está revendo a cadeia de valor. É falar algo, mas não fazer. Meu sonho é que não tenhamos tanto greenwashing. Temos pouca defesa do meio ambiente no Brasil, além do fato de que nossos problemas são estruturais e antigos. O greenwashing é uma embalagem que não corresponde ao conteúdo.

Aupa – A crise climática é um dos grandes desafios do século, ao mesmo tempo que o greenwashing pode disfarçar benefícios. É um desafio certificar resultados, portanto?
Graziella Comini – A crise climática está fazendo com que alguns fatores importantes, particularmente no mercado financeiro, elevem a régua na hora de fornecer crédito, financiamento, análise, processo de fusão e aquisição. Com isso, todo esse processo parece agora ser um elemento propulsor e interessante para que possamos forçar algumas grandes corporações a saírem de um patamar muito cômodo. 

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Aupa – Os pequenos negócios de impacto geram mais ou menos impacto climático do que as grandes corporações?
Graziella Comini – É difícil dizer que pequenos negócios de impacto geram menos impactos do que uma grande corporação. Os pequenos podem ser exemplos de comportamento e seu papel é mais qualitativo. Quando uma grande corporação muda determinados padrões e encara a importância de regenerar – no caso da água, recuperar nascentes para o tratamento da água e a diminuir o uso -, isso é crítico, pode influenciar uma indústria e gerar um impacto enorme por tudo o que representa uma grande corporação. Mas não quero diminuir a importância do pequeno negócio, no sentido de chacoalhar as grandes e mostrar que podem fazer a diferença, de ser um grande desenvolvedor de inovações sociais – que, depois, podem ser absorvidas e utilizadas por grandes corporações. São papéis diferentes e ambos são relevantes. O sistema só mudará quando a forma de atuar das grandes corporações mudar também. 

Aupa – Como os negócios de impacto podem contribuir para o impacto climático?
Graziella Comini Grandes corporações estão sendo cobradas para mostrarem o que fazem para amenizar seus impactos no meio ambiente. Quando falamos em negócio de impacto e este negócio causa problemas para o meio ambiente, é necessário se preocupar com modo de produção, sistema agroflorestal e contribuir para diminuir os impactos climáticos. É preciso pensar nos solos degradáveis e como regenerar esse solo usando outros tipos de espécies, usando o plantio e gerando renda para o pequeno produtor, pois isso gera energia renovável.

Aupa – De fato, é possível dizer que, cada vez mais, empresas estão assumindo o compromisso com redução de emissão de gases de efeito estufa, reaproveitando água e uso de energia renovável?
Graziella Comini Sim. Na verdade, tudo isso é emergencial e fundamental para a sociedade. A pressão do consumidor e/ou investidor é essencial para que a empresa contribua para fazer o tratamento da própria água e não use mais do que precisa. Ainda: pensar em projetos que não beneficiem apenas a empresa, mas que também tragam benefícios à sociedade. A cobrança da sociedade está sendo maior, pressão que faz com que a empresa tenha um compromisso maior com o meio ambiente.

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